Revista TriploV de Artes, Religiões e Ciências

Direção|Maria Estela Guedes & Floriano Martins

PÁGINA INDEX NÚMERO 05|ABRIL DE 2010

NÚMERO 05

Abril 2010 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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DORA GAGO

Mario Benedetti:

o poeta do exílio, do quotidiano

e do amor

Mário Benedetti, o escritor uruguaio nascido em Paso de los Toros a 14 de Setembro de 1920, faleceu em Montevideu, há quase um ano, a 17 de Maio de 2009.

Integrou a célebre “geração de 45”, juntamente com Idea Vilariño, Juan Carlos Onetti, entre outros.

Publicou mais de 80 obras (abrangendo poesia, ensaio, drama, conto, romance e  guiões cinematográficos), traduzidas em mais de 20 idiomas, sendo considerado um autor de primeiro plano da literatura latino-americana contemporânea. Podemos mesmo considerar que, através do seu estilo directo, simples, objectivo e coloquial conquistou o mundo. Em Portugal, encontram-se traduzidos e publicados pela “Cavalo de Ferro” dois livros: Obrigada pelo lume e A trégua.

Antes de se dedicar inteiramente à escrita, Benedetti exerceu as mais diversas profissões: trabalhou numa oficina aos 14 anos, foi taquígrafo, caixa, vendedor, livreiro, jornalista, tradutor, funcionário público e comerciante. Estes ofícios possibilitaram-lhe um contacto com a realidade social do Uruguai, determinante na modelação seu estilo e na essência da sua escrita.

Casou-se, em 1946, com o grande amor da sua vida, a sua esposa eterna, a quem dedicou dezenas de livros e de poemas: Luz López Alegre, falecida em 2006.

Benedetti tornou-se, em 1949, membro do conselho de redacção da Número, uma das revistas mais conceituadas na época. Além disso, dirigiu a revista literária Marginalia, em 1948, e publicou o volume de ensaios Peripecias y Novela. Mais tarde, em 1960, é editado La Trégua, romance adoptado ao cinema pelo realizador Sérgio Rénan.

Colaborou em diversos jornais, tendo dirigido entre 1968 e 1971 o Centro de Pesquisas Literárias da Casa de las Américas, de Havana (Cuba) do qual foi membro fundador.

Além disso, participou empenhada e activamente na vida política uruguaia e, em 1971, foi nomeado director do Departamento de Literatura Hispanoamericana na Faculdade de Humanidades e Ciências da Universidade da República de Montevideu.

Após o Golpe de Estado de 27 de Junho de 1973, Mário Benedetti renunciou ao cargo na Universidade, tendo partido para o exílio, primeiro para Buenos Aires, onde foi ameaçado de morte, posteriormente, para o Peru, onde foi detido e deportado. Em 1976, escolheu Cuba como destino, onde viveu durante quatro anos, rumando depois a Espanha, mais concretamente, a Madrid. Aliás, este último país foi considerado como um espaço privilegiado, o seu lar adoptivo.

Regressou ao Uruguai em 1983, iniciando o que autodenominou como período de “desexílio”, motivo de muitas obras. Nesta esteira, afirmou o autor: “El exilio es el aprendizaje de la vergüenza. El desexilio, una provincia de la melancolia”. Do seu país natal, salienta a mudança, após a ditadura, paralelamente ao seu próprio amadurecimento depois de ter vivido em quatro países tão distintos: “De los gobiernos no se aprende nada, pero de la gente de la calle yo aprendí mucho y entonces volví diferente, más maduro, otra persona, aunque siempre con el arraigo de mi ciudad”.

No entanto, foi o exílio que lhe permitiu atravessar todas as fronteiras e adquirir uma dimensão universal, sendo um dos temas que impregna diversas obras suas. Um exílio que pode ser exterior ou interior, adquirindo, por vezes, uma dimensão ontológica que ultrapassa o circunstancial. É a fragmentação provocada pela dor da separação da terra natal que muitas das suas personagens evidenciam em Geografias (1984), colectânea de contos, ou que transparece nos poemas de Viento de exílio. Destas obras, emergem também alguns aspectos positivos do exílio, como é o caso da compaixão, caridade, hospitalidade, que transparecem paralelamente à crueldade do homem para com os seus semelhantes ao descriminá-los e proscrevê-los.

Sobre a importância do exílio de teor ontológico em Benedetti - visto que antes de ser forçado a abandonar a pátria com a instauração da ditadura, o autor já se sente “estrangeiro” na sua Montevideu - refere Miriam Volpe:

 Para o intelectual uruguaio, parece haver uma única maneira de viver sua identidade: como estrangeiro, como estrangeiro em casa, ou como em casa de estrangeiros, pois a “estrangeiridade” se transformou na única casa possível. Uma casa que parece ser aquela predestinada para o criador, pois o exílio não faz mais do que acrescentar mais uma dimensão, ou um avatar, ao que já seria seu estado natural e exclusivo. A condição  fundamental da literatura, a condição autêntica de qualquer escritor seria uma forma de exílio, de ruptura, de autoproscrição. Enquanto a crisálida da criação se libera dentro do artista, ele já estaria no limiar do exílio. (Volpe 2003: 49)

 Deste modo, através de uma espécie de alienação, no sentido filosófico e humanístico, o exílio habitaria o autor antes de lhe ser imposto extrinsecamente.

Sempre fiel aos seus ideais, o poeta foi um acérrimo defensor da liberdade (em todos os sentidos), da justiça, da humanidade e da soberania dos povos. O seu apelo à constante luta, à perseguição dos sonhos, encontra-se num poema que espelha uma profunda resiliência, marchetada de esperança, intitulado “no te rindas” (1956): “No te rindas,/aún estás a tiempo/De alcanzar y comenzar de nuevo, /Aceptar tus sombras,/Enterrar tus miedos, /Liberar el lastre,/ Retomar el vuelo […]”

Relativamente aos seus mestres, Benedetti não hesita em mencionar Vallejo, Neruda, Pessoa e Borges.

Em suma, os temas que atravessam a sua obra são precisamente os mesmos que lhe percorreram a vida: o amor, a infância, o exílio, o quotidiano, numa constante partilha com o leitor, através da palavra. Isto porque, segundo o autor, quando a poesia abre as suas portas, tudo muda e mudamos com a própria mudança, sentimos que o tempo nos abraça, “cuando la poesia abre sus puertas / es como si cambiáramos el mundo”.

Bibliografia:
Benedetti, Mario. 1986. El desexilio y otras conjeturas. Bs.Aires: Nueva Imagen.
 
____________. 1988. Geografías. Montevidéu: Arca.
 
Cruz. Juan. 2009. “Adiós al poeta del compromiso”. El País. 17/05/2009.
http://www.elpais.com/articulo/cultura/Adios/poeta/compromiso/elpepucul/
20090517elpepucul_6/Tes
 
Marcos, Javier. 2009. “Un sentimental en la oficina”, El País, 29/04/2009.
http://www.elpais.com/articulo/cultura/sentimental/oficina/
elpepucul/20090429elpepicul_3/Tes
 
Seisdedos, Iker. 2009. “Fallece el poeta uruguayo Mário Benedetti à los 88 años”, El País, 17/05/2009 http://www.elpais.com/articulo/cultura/Fallece/poeta/Mario/Benedetti/88/anos/
elpepucul/20090517elpepucul_4/Tes

Volpe, Miriam. 2003. “Geografias de exílio: Mário Benedetti, um intelectual latino-americano” , Em Tese, v. 7, Belo Horizonte, dez. 2003, pp. 45-55.
_______________2006. “O jogo da memória e o esquecimento nas geografias do exílio”, A Contracorriente: Revista de Historia Social y Literatura en América Latina, Vol. 3, No. 2, Winter 2006 / Invierno 2006, pp. 34-50
http: www.ncsu.edu/project/acontracorriente

Dora Nunes Gago
Professora, doutorada em Línguas e Literaturas Românicas Comparadas, investigadora de pós-doutoramento na Universidade de Aveiro. Tem publicados: Planície de Memória (poesia, 1997); Sete Histórias de Gatos (em co-autoria com Arlinda Mártires), 1ªed. 2004, 2ª ed. 2005; A Sul da escrita (Prémio Nacional de Conto Manuel da Fonseca, 2007); Imagens do estrangeiro no Diário de Miguel Torga (dissertação de doutoramento),
Fundação Calouste Gulbenkian/FCT, 2008.
Além disso, tem poemas, contos e ensaios dispersos por diversos jornais, revistas e antologias. Tem apresentado igualmente diversas comunicações sobre as “imagens do estrangeiro na Literatura Portuguesa” em Congressos Internacionais.
Contacto: doragago@sapo.pt

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