REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


nova série | número 32 | outubro | 2012

 
 

 

 

MARIA AZENHA

Alguns sinais  de ouro breve 

Maria Azenha (Portugal). Foi professora universitária. Tem mais de duas dezenas de livros publicados.                        
 

EDITOR | TRIPLOV

 
ISSN 2182-147X  
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Dir. Maria Estela Guedes  
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Alguns sinais  de ouro breve 

 

Alguns sinais  de ouro breve

e a flor de agosto

que investiga o rosto

e se despede de uma folha de fogo

 

nela desliza  o silêncio vivo

a pluma do vento

e alguns versos

ampliando a música do sol

 

alguns sinais  de ouro

 breve

estendendo o corpo sobre

um mar de mel

 
 

Em todas as manhãs de neblina 

 

Partiu de mim o mar

e nada sei sobre barcos.

conheço o nome da árvore da solidão

como um cais onde se chega e parte.

 

o cais cinzento e branco

é uma ave triste no centro

na história da transparência das tuas mãos.

 

há um espelho escondido por dentro da neblina

que me leva a uma zona proibida.

 

depois ficamos a sós

e mais nus ainda. 

 
 

Uma doce melancolia  

 

Debruço-me a olhar o mar. 

Penso na minha vida.

Lá dentro o aspirador vai sumindo  o pó da casa.

Vou falando  baixo. Mais baixo, ainda.

Apetecia-me desparecer  no meio da água

Como um peixe. Ou uma alga.

Ou mesmo decompor o meu corpo em moléculas de H2O:

imortal  e  límpida, em movimentos  regulares .

Com  as gaivotas agora já em terra

aprendo  a verter  a melancolia do ouro  

com o astro solar.

Uma mulher estrangeira penteia-se diante da água.

O silêncio dos afogados aflora. 

 
 

Esta hora vulgar 

 

Esta hora vulgar

Esta hora lugar

Esta hora para toda a gente que vive sem sistemas…

Sei lá quem sou eu , outrora,  agora !

Sou eu quem eu sei?

Sei lá!

Se eu sou, sei?

 

A vida …

São trémulas luzes e adivinhas que nunca acharei… 

 
 

Ainda não é noite  

 

Ainda não é noite.

Pelo respirar das ruas desertas

As casas estão cheias de gente.

Juntas umas às outras  atingem  a dimensão de  um hotel.

Ou de um hospital. Ou de um inferno.

Hoje quero desempenhar o papel de Deus

Com um poema que esplenda na escuridão.

Um poema que decifre o mistério dos mortos 

Que coseram a boca ao  horizonte  e adormeceram  no solo.

 

Vejo uma borboleta que  estremece  as asas. É branca, indecifrável .

Parece um pedaço  de  névoa   que esvoaça fora da terra.

Não quer  ser ignorada, sim, ignorada 

 Pelos deuses ,pelas folhas das árvores que voam e  

Caem    em baixo sem  explicação .

 

Hoje quero desempenhar o papel  de  Deus  num poema

Que arda na escuridão para  biliões de seres humanos.

Não sei quantos palavras juntei  até  pagar esta conta.

Ocupo a página branca.

Meço alguns  centímetros acima do chão.

 
 

Canção 

 

Ouve, meu filho, o silêncio.

É o silêncio de um olival.

Duas mãos soam a bater palmas:

O vento e a lua,

A lua e o vento,

e o manto negro do olival.

 

Com mantos de seda

vai pelo vento

o silêncio,

com lâmpadas nos dedos

e um leque de cristal.

 

 

Ouve, meu filho, o silêncio.

É o silêncio de um olival.

 
 

Metrópole 

 

Porque será que há tantos muros?

Tantos muros,

cada vez mais altos? 

 

 

Revista InComunidade (Porto)

 

 

 

 

© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
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