REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências


Nova Série | 2011 | Número 11

 

JOAQUIM CARVALHO

 

D. Nuno Álvares Pereira

— São Nuno de Santa Maria

 

 

DIREÇÃO  
Maria Estela Guedes  
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I

 

Condestável do Reino, foi!

Por uma vez

Poder e Dever se fundiram no mesmo Ser.

 

Do firmamento, de entre todos os astros,

desceram estrelas cadentes

— luzeiros de celestiais Impérios!;

Do rectângulo de terra morena por mar recortado,

ergueram –se mil cruzeiros

— sinaleiros de colossais mistérios!

 

Com suas assertivas mãos

tanto se dedicou a Deus como ao Rei:

─ Se com a direita elevou a espada

e Serviu o Reino como ninguém,

com a esquerda segurou a Cruz Sagrada

e Serviu o Império que Deus sustém.

 

Nas encruzilhadas dos caminhos,

semióticas pedras da terra em fogo se ergueram

debruadas de bons recados.

Cânticos dessas florescidas rochas

ainda hoje ecoam:

— Ínfimas e intemporais pétalas

da dureza do quartzo

ciciam conselhos sábios aos caminheiros

que peregrinam por fé coroados!...

 

Em dias de substantiva luz

ou debaixo de celestiais arcos de noite

de onde penderam lua-cheias de nacaradas respirações,

alimentou hiatos de tempo perscrutando saber

o que, do corpo e da alma, haveria de convir.

De singulares inquietações apurou:

— do corpo, a mecânica força;

— da alma, a sublime razão!

 

Disruptiva claridade em horas veras de achar-se

abriu caminho para a mudança a ter-se.

Foi chave do que seria certo ser-se.

Quando perto o som longínquo se tornava, ouvia-se:

— Sempre que puderes larga a espada.

Usa mais a esquerda mão. A que segura

a Cruz Sagrada

Age menos com a dextra — a da espada;

— Que transpareça mais leveza em teu rosto.

Deixa só fluir luz por amor coada;

— Incorpora-Me em ti na essência do que sou.

Abre-me por inteiro o teu coração;

 — Acha-me nos outros e ajuda-me

a permanecer neles.

Nada será em vão!... 

 

II

 

Sob luz plangente

viu rosas de sanguíneas pétalas

cobrirem o rosto de Nossa Senhora de guerra cansada.

Chorou por todos

com a Imperatriz detentora do poder de ser Mãe

de Gentes e de Reinos! —

Suas lágrimas foram nascente de rios

de límpidas águas correntes

entre serras e outeiros.

Sentiu Deus presente. Assumiu d´Ele todos os passos de futuro!

Sem Deus tudo seria incerto: ponderação

só almas amparadas ditam. 

 

Qual Galaaz,

tomou de Nossa Senhora, como escudo,

o seu branco e infinito manto de justiça e paz!

Com suas refulgências

armou de luz todos os justos soldados-guerreiros

que pelo Reino em quadrado se ergueram comungando

o mesmo pensar e querer:

— Impedir Castela de fazer Portugal tombar

e, como país independente, morrer!

 

Para cumprir sua vontade primeira

— ajudar D. João, Mestre de Avis,

a ser Rei de Portugal e Algarve —,

à Virgem Santíssima pediu visão certeira.

 

Em terrena epopeia congregou

Cavaleiros, Fidalgos e Povo descontentes!

As batalhas travadas foram duras. Mas gloriosas!

Não se importando de onde as Gentes vinham

— se de além ou de aquém —,

enalteceu-lhes a vontade que tinham de resistir

e o engenho!

Mesmo se lhes faltava armas ou cota,

orientava-lhes as forças nas direcções a convir!

E produziu vitórias: Valverde, Atoleiros, Aljubarrota!

— Vitórias contra muitos mais invasores castelhanos

do que quantos todos eles combatentes

portugueses eram!;

— Vitórias em combates valorosos

onde pazadas com pás de enfornar pão

tiveram mesmo préstimo

que golpes produzidos por afiadas

e exercitadas espadas!

 

Empurrou para Castela os derrotados

— paisanos-cavaleiros-soldados —

saqueadores das terras

dos mais ocidentais mosteiros! 

Ofereceu alimentos aos vivos vencidos

e curou-lhes os feridos.

Chorou os mortos de ambas as fileiras.

Deu-lhes sepultura. Por todos rezou.

 

Com grande sabedoria

constituiu-se, sem alarde,

esteio verdadeiro

da independência do Reino de Portugal e Algarve.

Quis que fosse Rei D. João I.

 

Assumindo ter sido em pretérito tempo

o próximo-mais-do-que-imperfeito de Deus,

rezou à Virgem Maria com fervor.

Suplicou-Lhe perdão. Declarou-Lhe

seu eterno e infinito amor.

Prometeu-Lhe só demandar justiça e paz

em futuros feitos.

E por convicção depôs a espada!

 

Aos seguidores de sua dextra mão deu guia.

Cobriu-os na devoção e na fé

com o mesmo véu sob o qual Deus o ungira.

Em apoteóticas orações ao Céu

armou-os com o imperioso sonho

de praticarem o bem

com aqueles que nada ou pouco tinham.

 

Conquistando caminhos de muitos e longos

passos rezando,

foi como D. Nuno Álvares Pereira!

de Deus mais se abeirou.

Antes de ter assento em altar foi crido Santo!

 

Hoje, Portugal e Mundo rejubilam de alegria!

Há mais um Santo para venerar nos altares.

Santo Condestável!

Para sempre, São Nuno de Santa Maria! 

 
Fig. 1 - D. Nuno Álvares Pereira. Juventude. Técnica mista sobre tela. 130x89cm Fig. 2 - D. Nuno Álvares Pereira. O guerreiro vencedor de batalhas. Técnica mista sobre tela. 90x90cm
 
Fig. 3 - D. Nuno Álvares Pereira. O guerreiro vencedor de batalhas. Técnica mista sobre tela. 90x90cm Fig. 4- Aparição de Nossa Senhora. Técnica mista sobre tela. 90x90cm
 
Fig. 5 - Vesti-me de branco e tomei-Te em meus braços, Nossa Senhora. Técnica mista sobre tela. 90x90cm Fig. 6- Frei Nuno de Santa Maria. Técnica mista sobre tela. 90x90cm
 
Fig. 7 - São Nuno de Santa Maria. Técnica mista sobre tela. 90x90cm Fig. 8 - Mestre de Avis, D. João I de Portugal.
 
Fig. 9 - D. João I de Castela e Leão. Técnica mista sobre tela. 90x90cm Fig. 10 - D. Nuno Álvares Pereira ao ingressar no convento. Acrílico sobre tela. 90x90cm
  Pinturas de 2010
 

 

JOAQUIM CARVALHO (PORTUGAL)
Poeta e pintor, com vários livros publicados e participação em numerosas
exposições colectivas e individuais.
 

 

 

© Maria Estela Guedes
estela@triplov.com
PORTUGAL