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ANTÓNIO
DE MACEDO

FREI GIL FAUSTIANO
OU FAUSTO EGIDIANO?
ÍNDICE
12. O daimon de Fausto

Nos séculos XV e XVI vulgarizaram-se na Alemanha os Deutsche Volksbücher, livros de histórias e lendas mais ou menos fantásticas, sobre personagens reais ou míticas, como por exemplo Siegfried, Alberto Magno, Frederico Barba Roxa ou a Fada Melusina. Um dos mais famosos, cujo manuscrito surgiu por volta de 1580 e acabou por ser impresso em 1587, é uma biografia romanceada do Doutor Fausto e intitula-se Historia und Geschicht Doctor Johannis Faustj . Mais tarde, em 1620, o manuscrito foi adquirido pela importante biblioteca do Duque Augusto de Wolfenbüttel e passou a ser designado entre os eruditos como «manuscrito Wolfenbüttel». Desde muito cedo, porém, a edição impressa desse Volksbuch (conhecida como Das Faustbuch, 1587), teve uma divulgação meteórica e foi lida por toda a Europa, salientando-se uma tradução inglesa, da autoria de P. F. Gent (1592), com o título Faust Book: “Historia” & Tale Of Doctor Johannes Faustus (ver: Jones 1994, passim).

 

O Doutor Johann Faust, médico, filósofo, necromante e astrólogo alemão (?- ca. 1540) celebrizou-se pelo seu pacto com o Diabo, a quem vendeu a alma em troca do poder (potestas) e do conhecimento (scientia) — tal como, antes dele, o diácono Teófilo e Frei Gil de Santarém.

Uma outra característica de Fausto, em que tão-pouco é original, está na sua relação com um espírito demoníaco a quem chamava Schwager («amigo íntimo, velho camarada»), e com o qual entretinha uma ligação convivial tal como Sócrates com o seu daimon. São bem conhecidas as passagens nos diálogos dePlatão em que Sócrates define os daimones e descreve o convívio com esses seres sobrenaturais, forças interiores entre os deuses e os humanos com algumas características irracionais mas domesticadas pela razão, e que acompanham a vida de cada pessoa, como guias e conselheiros pessoais, para ajudarem a pessoa a cumprir o seu destino — cf. por exemplo: Apologia de Sócrates (27c-e), Crátilo (397e-398c), Banquete (202d-e), Fédon (107c-d, 108a-b), República (620d-8), etc.

O primeiro encontro entre Fausto e o tal demónio que se tornou seu companheiro ocorre logo no capítulo II do Faustbuch, quando Fausto se dirige a uma densa floresta chamada Spesser Wald, situada perto de Wittemberg, e, mediante fórmulas mágicas, figuras de feitiçaria e esconjuros realizados entre as nove e as dez horas da noite, numa encruzilhada da floresta, conseguiu que lhe aparecesse enfim, após vários prodígios alarmantes, um espírito diabólico sob a aparência de um frade franciscano. Nos capítulos seguintes sucedem-se vários encontros, os últimos já em casa de Fausto, e em dado passo o demónio confessa que não pode outorgar a Fausto todos os poderes que este desejaria porque tem de se submeter ao Senhor dos Infernos, Lúcifer, mas ao fim de várias negociações Fausto dá-se por satisfeito com as condições e as vantagens que finalmente obterá, e acede em assinar um pacto com o próprio sangue: abriu uma veia no pulso esquerdo, fez escorrer o sangue para um almofariz, meteu-lhe uns carvões em brasa e escreveu uma obligatio que o Faustbuch reproduz no seu capítulo VI. Com isto, assegurou-se dos serviços incondicionais do demónio, cujo nome veio a conhecer: Mephostophilis.

 

Para uma bibliografia egidiana