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MARIA DO SAMEIRO BARROSO
No jardim dos livros

Os livros são objectos aromáticos guardados nas estantes

da memória, sementes de orvalho, estrelas onde assoma o infinito.

Nos seus jardins de goma-arábica, com o céu nas margens,

verde, cor de marfim é a sua volúpia acesa,

a sua centelha branca, a sua seiva cor de sangue.

 

Luxurioso é seu corpo, o seu júbilo, a sua forma, o seu perfume,

onde a sede e a veemência se prolongam.

Na exactidão do seu lume, irradiam a luz, a cor,

a sua chama sempre viva.

 

Entre estrelas, dinamite, é lá que o coração dos seres respira

e o silêncio pulsa,

envolto na sedução da luz e dos oásis.

Com lábios de areia e musgo, é lá que bebo o mar, a luz,

a terra a apodrecer

― o corpo flutuando entre estrelas, madrepérola.

 

É lá que afluem objectos preciosos, roseiras, grutas, pirilampos.

Nas suas árvores de raízes negras, irreais,

assomam as fábulas, poemas, em taças volumosas,

transparentes.

 

Nas suas vogais, há cais secretos, nascentes ébrias,

fósforo incandescente.

Nelas se inscreve a língua arguta das pedras eloquentes.

No seu mar de peixes exóticos, espalham-se,

as lombadas da vida, as aguadas da morte.

E nada impede o coração, cotovia inadiada.

 

No seu murmúrio, derrama-se a vertigem em flor.

 

 

Maria do Sameiro Barroso

In Afectos, Labirinto, Fafe, 2006, pp. 23-25.

Maria do Sameiro Barroso é licenciada em Filologia Germânica e em Medicina e Cirurgia, pela Universidade Clássica de Lisboa. Exerce a sua actividade profissional como médica, Especialista em Medicina Geral e Familiar.

Em 1987 iniciou a sua actividade literária, tendo publicado livros de poesia e colaborado em antologias e revistas literárias. A partir de 2001, a sua actividade estendeu-se à tradução e ensaio, tendo publicado, em revistas literárias e académicas.

Em 2002 iniciou a sua actividade de investigadora, na área da História da Medicina, tendo apresentado e publicado trabalhos, nesta área.