ANTÓNIO JUSTO...

A criatividade segue o Interesse

As ideias circulam à volta das nossas preocupações como as abelhas à volta do favo. Não chega tomar consciência das próprias ideias e sentimentos. A disposição está na base das nossas vivências. Não somos enganados pela vida mas pelas ideias que fazemos dela. Para irmos buscar as soluções à fonte da intuição necessita-se de calma para passar os muros do ego. Este produz muitas ideias e sentimentos com que nos identificamos e a que nos agarramos, mas, frequentemente, não passam de ruído, de roupagem. O tesouro de cada um é mais que a roupagem que o encobre. O tesouro da criatividade encontra-se enterrado no campo da vida, como revela o evangelho. Encontram-se muitos talentos enterrados em nós, à espera de descoberta enquanto dançamos a dança dos outros sem descobrir a harmonia da orquestra do nosso interior. A verdadeira intuição dá-se no fluxo da criatividade, lá onde tudo flúi (panta rei), onde tudo é movimento e mudança. Aqui, no âmago de nós mesmos, descobrimos o que é importante para nós e para os outros. Uma vez descoberto aquilo que é importante para nós, a criatividade em nós vai desenvolver respostas e métodos de realizarmos o que descobrimos. A criatividade ao dar resposta ao que é importante para nós premeia-nos com a sensação do sentido realizado.  

A pessoa, para quem é importante ser amada, desenvolve todas as formas da criatividade que a levam a ser amada. Para quem é importante a comida, desenvolverá formas de criatividade especiais na arte de cozinhar, criando receitas novas, etc. O sistema do nosso pensamento pode enganar mas a alma não. A criatividade segue o interesse. Trata-se de descobrir se somos nós que fazemos experiências ou se as experiências nos fazem a nós. 

É muito importante habituar-nos a escutar e ouvir o sábio que temos dentro de nós, escutar o coração e a razão. O coração tem razões que a razão não vê, dizia Pascal. Neste caso a decisão estará mais perto da verdade. Em questões de diálogo, podemos, então, embarcar com o outro sem o perigo de o aprisionarmos ao nosso lago ou de nos deixarmos arrastar nas suas águas. 

A vida é uma grande aventura, aberta em todos os sentidos. O nosso interesse é que determina o roteiro. No mar da vida há muita gente ao sabor das ondas sem timão nem vela porque não descobriu o seu interesse, a sua meta! Para o conseguirmos será preciso transpor as encostas das ideias e sentimentos para se alcançar novas perspectivas. Se queremos ir e ver mais longe há que confiar na visão que vem da intuição, de sentimentos que se alimentam também de dimensões para lá do tridimensional espácio-temporal. Nela se encontra a parte com o todo, se encontra o Alfa com o Ómega; o mar irmana-se com o monte, na nascença do rio. Aqui começa o mistério da relação e do encontro que se expressa na visão cristã, da Realidade como relação tríade. 

Na intuição sentimentos e ideias submetem-se a um processo semelhante ao da larva no casulo, que perde a sua forma exterior para se tornar em borboleta! Nela flúi a gratidão e a compaixão que nos identifica e une. 

Compaixão e gratidão impedem a enxurrada dos sentimentos formando como que uma espécie de GPS interior. Em vez de nos fixarmos nas curvas da estrada e nos diferentes letreiros (ideias e sentimentos leves) concentramo-nos na condução que leva à meta. A vida é bela, é encontrar-se a caminho na peregrinação universal! 

A vida não engana, quem engana são as ideias e, por vezes, certos sentimentos embrulhados nas dobras do pensamento!

 

ANTÓNIO da Cunha Duarte JUSTO . Nasceu em Várzea-Arouca (Portugal). E-mail: a.c.justo@t-online.de.

Professor de Língua e Cultura Portuguesas, professor de Ética, delegado da disciplina de português na Universidade de Kassel .

PUBLICAÇÕES  

- Chefe Redactor de Gemeinsam, revista trimestral do Conselho de Estrangeiros de Kassel em alemão com secções em português, italiano, turco, françês, grego, editada pela cidade de Kassel, tiragem 5. 000 exemplares.

- Editor da Brochura bilingue: "Pontes Para um Futuro Comum – Brücken in eine gemeinsame Zukunft", editada na Caritas, Kassel

- Editor de "O Farol" , jornal de carácter escolar e social em colaboração com alunos, pais e portugueses das cidades de Bad Wildungen, Hessisch Lichtenau, Kassel, Bad Arolsen e Diemelstadt( de 1981 a 1985)

- Editor de „Boletim da Fracção Portuguesa no Conselho de Estrangeiros de Kassel (1984)

- Autor da Brochura „Kommunalwahlrecht für Ausländer – Argumente“ editada pela Câmara Municipal de Kassel, Fevereiro de 1987.

- Co-autor da Brochura „Ausländerbeiräte in Hessen - Aufgaben und Organisation“, editada pela AGAH e Hessische Landeszentral für politische Bildung, Wiesbaden, 1988.

Colaborador de vários jornais e do programa de rádio semanal de português de Hamburgo.

http://blog.comunidades.net/justo