CUNHA DE LEIRADELLA

A SOLIDÃO DA VERDADE

ROMANCE

II PARTE - A SOLIDÃO

Dezassete

Foi um dia bom. Almoçamos logo que abriu o restaurante e passamos a tarde nas matas das colinas. Andréa nem lembrou dos cavalos, mas estava alegre e parecia estar feliz. Corria e deitava no capim, e ria por tudo e por nada.

Quando voltamos o restaurante estava cheio e tivemos que sentar junto da porta. Não gostei da mesa, mas não havia outra disponível. As que ainda estavam vagas, estavam reservadas. O bufê estava armado no meio do salão e os garçons, com bandejas carregadas de garrafas, serviam as bebidas. Um grupo de moças e rapazes dançava na varanda e alguns dos rapazes, sentados no parapeito, riam e faziam grandes gestos, e atiravam ao ar latas de cerveja. Não fazia luar e as matas das colinas mal se viam. Servimo-nos e sentamos, e pedi duas cervejas.

Passado algum tempo, um casal sentou numa das mesas reservadas, à nossa esquerda. A mulher era magra e tinha o cabelo curto e muito louro, e o homem era moreno e prendia o cabelo com uma fita de malha. Ambos usavam shorts de jeans e camisetas sem mangas, e a mulher parecia um travesti. O homem chamou um garçom e pediu dois uísques, e a mulher falou algumas palavras numa língua que não entendi. O homem olhou a nossa mesa e a mulher cumprimentou-nos com um ligeiro aceno de cabeça Olhei Andréa. Ela olhava a mulher, mas não retribuiu o cumprimento.

- Você conhece?

- Não. Só vi a mulher por aí.

- Quando? Eu não vi, não.

- Antes de sairmos. Quando fui comprar cigarros.

- São estranhos.

Andréa não responde. Afasta o prato e pega o copo e bebe um gole, e fica com ele na mão. Termino de comer e bebo também.

- Parece que tão querendo alguma coisa.

Andréa encolhe os ombros e bebe outro gole.

- Deixa. São turistas.

Levanta o copo e fica com ele na frente dos olhos, e parece olhar a mulher através dele. Olho o casal. A mulher continua com a queixo apoiado nas mãos e olha Andréa. O homem acende um cigarro e olha-me, e a mulher entreabre os lábios e a ponta da língua aparece por entre os dentes. Não gosto do gesto e desvio o olhar, e Andréa coloca o copo na mesa e fecha os olhos, e, de repente, começa a coçar o peito, por baixo do seio direito.

Sinto vontade de xingar a mulher e as minhas mãos tremem e querem pular na minha frente, e Andréa pára de coçar. Mas continua com raiva, a testa vincada de rugas e o corpo tenso, como se estivesse num ringue e só esperasse a batida do gongo para massacrar o inimigo. Debruço-me na mesa e pego na mão dela, mas ela parece nem sentir. Olho o casal. A mulher tem o copo na frente da boca e olha para Andréa, e o homem está recostado na cadeira e olha o grupo de moças e rapazes, dançando na varanda. Andréa tira a mão da minha e pega a chave do quarto, e levanta-se.

- Vou deitar.

É uma reação tão repentina que me confunde.

- Não vai na represa mais, não? Você disse que ia.

Andréa não responde e sai sem me olhar. Não fiquei magoado, nem com raiva. Eu sabia o que era estar assim. Chamei um garçom e pedi a conta. Estava bem e estava calmo, e, depois do que tínhamos dito e feito naquele quarto, não havia mais do que ter medo ou duvidar. Andréa estava junto de mim e era minha.

Olhei o casal. A mulher falava numa língua que não entendi e o homem olhava-me e acenava com a cabeça. Deviam estar comentando a saída de Andréa e a briga que viria. Sorri. Realmente, eram estranhos, muito estranhos.

O garçom trouxe a conta. Assinei a nota e dei-lhe uma gorjeta, e subi para o quarto. A porta estava destrancada e Andréa estava deitada, ainda vestida e fumando, e a janela estava fechada e o quarto cheirava a fumo de cigarro. Na mesa-de-cabeceira havia uma garrafa de cerveja e um copo, ambos vazios, e o cinzeiro estava em cima do colchão, ao lado dela. Sentei-me na beira da cama e Andréa não se mexeu, nem disse nada. Continuou fumando e olhando o teto, como se estivesse sozinha. Deitei a cabeça no colo e esperei que dissesse ou fizesse alguma coisa. Mas o tempo passou e Andréa não disse, nem fez nada.

- Quê que você tem, hem?

Andréa esmaga o cigarro no cinzeiro e não responde, e a minha garganta aperta e os ouvidos começam a zumbir. Passa algum tempo e, de repente, Andréa abraça-me e aninha a cabeça no meu peito, e aperta o corpo contra o meu. E ficamos assim, abraçados e calados, ela respirando aos arrancos, como se estivesse chorando, e eu não sabendo o que dizer. Só muito tempo depois Andréa serena e o corpo fica relaxado.

- Você gosta de mim?

- Você sabe que eu gosto.

- Promete gostar sempre?

- Andréa...

- Você jura?

- Claro que eu juro.

- Jura mesmo?

- Andréa...

Andréa sorri e encosta os lábios no meu pescoço e passa a língua na pele. Um arrepio desce pela espinha e um calor repentino sobe pelas virilhas, e abraço-a com mais força e vou beijá-la, e passos rápidos de mulher soam no corredor, os saltos batendo forte no cimento, e uma voz de homem grita, peraí, peraí. O barulho dos passos acelera-se e pára de repente, e uma porta bate com força. Soam pancadas na madeira e a voz do homem grita, abre essa porta, sua puta, abre essa porta ou eu te mato. As pancadas e os gritos duram algum tempo e terminam, e tudo fica, de novo, silencioso. Andréa puxa a minha cabeça contra os seios e roça os lábios no meu ouvido.

- Ainda quer olhar os meus seios?

Senta-se na cama e aperta os braços contra o corpo e os seios unem-se e saltam do decote, e a minha garganta formiga e a boca fica seca.

- Sabia que o direito é menor e, às vezes, coça até doer?

Abre a blusa e baixa o sutiã.

- Tá vendo?

Suspensos pelo tecido e apertados pelas alças, os seios parecem ainda maiores e mais cheios. Tenho vontade de pegá-los e Andréa tira a blusa e o sutiã e eles ficam soltos, e o meu sexo começa a latejar.

- Não é mais pequeno, não?

Não respondo. Não posso. Os olhos estão fixos no seio e o sexo lateja mais, e a boca parece lixa. Andréa deita-se e mostra a pele do peito, áspera e com vergões amarelados.

- Tá vendo? É sempre aqui que coça. Quando fico injuriada, coça tanto que meto até a unha.

- Já foi no médico?

- Ele diz que é dos nervos.

- E é?

- Não sei. Ele diz que é.

Os seios estão esparramados no peito e as minhas mãos tremem. Pego-os e passo a língua na pele, e Andréa ri e negaceia.

- Pára. Não faz isso.

- Tá doendo?

Andréa não responde. Tira a minha camisa e mete a língua na minha boca, e eu sei que posso fazer com aqueles seios o que nunca fiz nos cinemas ou no meu quarto. Mordo a língua de Andréa e puxo o corpo contra o meu, e ela crava as unhas nas minhas costas. É um beijo furioso, mordido até doer, e as respirações ficam entrecortadas e ofegantes, e as bocas enchem de saliva. Andréa cruza as pernas nas minhas costas e esmaga os seios no meu peito, e a minha nuca estala e um grito sobe na garganta. Andréa grita também e os nossos gritos ecoam pelo quarto. Ensopados de suor e as calças grudando nas virilhas, tombamos na cama, resfolegando. Amolecidos como mortos. O mal-entendido do jantar deixou de ser mal-entendido.

 
 
 

Cunha de Leiradella
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