Artur Augusto da Silva

E O POETA PEGOU NUM PEDAÇO DE PAPEL E ESCREVEU

Fonte:
Artur Augusto da Silva
E o poeta pegou num pedaço de papel e escreveu
Poemas
Bissau, Instituto Camões, 1997

Poemas - Index

O CHEFE
Cântico à maneira Fula

AO FERREIRA DE CASTRO

Que o som dos tambores inflame as minhas palavras;
que o grito dos guerreiros exalte o meu ardor
e a aprovação das mulheres
cubra este canto,
como as árvores cobrem as feridas dos heróis.

Como um tornado que passa pela floresta,
quebra os altos ramos
e faz tombar as grandes árvores,
assim Monjur passava entre os inimigos...

Como o raio que cai dos céus
e derruba a maior árvore da floresta,
assim Monjur vencia os poderosos.

Como a água tépida que escorre pelos corpos cansados
e faz reviver o coração,
assim Monjur governava o seu povo.

Com a rapidez da gazela das lalas
correu por toda a terra dos Fulas
o nome de Monjur
e Alá teve medo dele,
receou as suas vitórias e a sua santidade,
e resolveu que morresse.
Nesse dia o povo Fula
chorou o seu chefe,
e Alá dormiu descansado.

Alá, tu que és grande como a terra
e poderoso acima de todos
tu que sabes o passado e o futuro
e tudo vês,
restitui-nos o grande chefe,
que te daremos doze carneiros brancos
e cinco bois,
e sete nozes de cola,
e um cabaço de almoço.

Artur Augusto Silva nasceu na Ilha da Brava, a 14 de Outubro de 1912. Ainda estudante, foi Director da revista “Momento”, réplica lisboeta da coimbrã “Presença”, onde se propunha com outros literatos jovens abrir uma “Tribuna Livre” em que livremente se discutisse e todos pudessem falar. Publicou vários artigos, fez reportagens, dirigiu saraus literários, organizou exposições de arte moderna, promoveu conferências culturais na Casa da Imprensa, na Sociedade Nacional de Belas Artes e em vários outros locais de Portugal.

Licenciou-se em Direito em 1938. Em 1939, partiu para Angola, onde trabalhou como Secretário do Governador Geral. De 1941 a 1949 exerceu advocacia em Lisboa, em Alcobaça e em Porto de Mós. Em 1949, partiu para a Guiné onde foi advogado, notário e substituto do Delegado do Procurador da República. Foi também Membro do Centro de Estudos da Guiné, juntamente com Amílcar Cabral, de quem era grande amigo.

Visitou vários países africanos, recolhendo elementos que mais tarde lhe serviriam para escrever, entre outros livros, “Os Usos e Costumes Jurídicos dos Fulas”.

Um dos seus comprometimentos cívicos em que mais se empenhou consistiu em defender presos políticos. Foi defensor em 61 julgamentos, um deles com 23 réus, tendo tido apenas duas condenações.

Em 1966, já em plena luta de libertação da Guiné, foi preso pela Pide, no aeroporto de Lisboa. Meses mais tarde, por intervenção de Marcelo Caetano e de outros responsáveis políticos, que embora discordassem das suas ideias políticas o admiravam como homem de carácter, foi libertado, mas proibiram-lhe que regressasse à Guiné, sendo-lhe fixada residência em Lisboa.

Em 1967, Marcelo Caetano, convidou-o para ir trabalhar como advogado na Companhia de Seguros Bonança. Também Adriano Moreira o convidou para leccionar no Instituto de Ciências Ultramarinas, o que ele recusou, fazendo ver ao portador do convite a incoerência de o terem prendido pelas suas ideias sobre o colonialismo português e depois o convidarem para leccionar matérias relacionadas com África.

Em 1976, de visita à Guiné-Bissau, foi convidado pelo então Presidente Luís Cabral para trabalhar como juiz no Supremo Tribunal de Justiça. Também leccionou Direito Consuetudinário na Escola de Direito de Bissau.

Faleceu em Bissau a 11 de Julho de 1983.

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