REVISTA TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE

 

 

 

 
 

A.M. GALOPIM DE CARVALHO

2015 - ANO INTERNACIONAL DOS SOLOS

Falando dos solos (9)

Textura

Esta importante característica do solo é definida pela dimensão das partículas terrígenas nele contidas, encaradas como elementos de uma população, neste caso, a respectiva componente mineral.   Por influência dos colegas franceses, o estudo desta característica tem sido designado, entre nós, pela maioria dos autores, pelas expressões granulometria e análise granulométrica. Amplamente divulgadas na bibliografia científica da especialidade e nos manuais e outros textos dirigidos ao ensino, estas duas expressões, sinónimas entre si, apenas são correctas quando aplicadas aos sedimentos arenosos, siltosos e argilosos. Não o são, em rigor, quando se referem aos clastos grosseiros como são os calhaus, os seixos e outros  ruditos (1). Com efeito, o elemento grânulo (diminutivo de grão), usado na composição destas expressões, não é coerente com o carácter, por definição, grosseiro de conglomerados, brechas, cascalheiras, conheiras, moreias, etc.. Ao preferirem as designações textural analysis, mechanical analysis e size analysis,   os autores anglo-saxónicos encontraram maneira de contornar esta incoerência.

Pioneiro da investigação sedimentológica, Soares de Carvalho, Professor jubilado da Universidade do Minho, com obra publicada neste domínio, propôs para este tipo de análise, em 1968, o nome dimensometria, que abandonou em favor da expressão análise dimensional, (equivalente do inglês size analysis) no que tem sido seguido por outros autores nacionais. Uma vez que, como se referiu atrás,  as dimensões dos elementos terrígenos são usadas na definição das texturas clásticas, a expressão análise  dimensional é, de facto, sinónima de análise textural. A outra expressão equivalente – análise mecânica – pouco ou nada usada entre nós, decorre, e bem, do capítulo da física, no qual se fundamenta este tipo de análise baseado, em especial, na crivagem, na queda por gravidade e na dinâmica dos fluidos. Não obstante as razões aduzidas, granulometria e análise granulométrica são hoje expressões generalizadas e consagradas entre muitos profissionais portugueses que utilizam esta técnica analítica (geólogos, pedólogos, geógrafos, engenheiros, etc.) e, como tal, ganharam direito a figurar no nosso vocabulário. Em conclusão, acentua-se que as expressões análise textural, análise dimensional, análise mecânica e análise granulométrica ou granulometria são sinónimas e todas elas (umas mais, outras menos) usadas entre nós.  

Têm sido, ao longo dos anos, várias as propostas de escalas dimensionais com vista a este tipo de análise, não só de populações naturais (rochas detríticas e piroclásticas, rególitos e solos), como também de outras artificiais (britas, granulados e pulverizados das indústrias mineira, vidreira, cerâmica, alimentar, farmacêutica, etc.). Em 1898, o americano Johan August Udden (1859-1923) propôs a sua escala granulométrica, segundo uma progressão geométrica de razão 2 (ou 1/2, consoante o sentido do cálculo) com doze classes definidas pelos seguintes valores em milímetros: 16, 8, 4, 2, 1, 1/2, 1/4, 1/8, 1/16, 1/32, 1/64, 1/128 e 1/256. Anos mais tarde, em 1922, o seu discípulo Chester Keeler Wentworth (1891-1969) introduziu-lhe ligeiras alterações, alargando grandemente a sua utilização entre uma comunidade de sedimentólogos nascente e em crescimento. Em 1905, o alemão Albert Mauritz Atterberg (1846-1916) divulgou a sua classificação com base no valor unitário 2 mm, desenvolvida segundo uma progressão geométrica de razão 10 (dez), com os seguintes intervalos:

>200 mm – Block (bloco)

200 a 20 mm – Stein (burgau)

20 a 2 mm – Geröl (cascalho)

2 a 0,2 mm - gross Sand (areia grosseira)

0,02 a 0,002 mm - fein Sand ( areia fina)

0,002 a 0,0002 - Silt (limo)

<0,0002 – Ton (argila)

Segundo este autor, os valores escolhidos para limites das classes dimensionais propostas correspondem a pontos de mudança das propriedades físicas fundamentais dos clastos como, por exemplo, capilaridade, adesão, sensibilidade aos movimentos brownianos (2). A escala de Atterberg foi adoptada em 1927 pela Comissão Internacional da Ciência dos Solos, sendo ainda utilizada, em especial, nos laboratórios de Pedologia de muitos países europeus, entre eles, Portugal. Ao qualificarem os solos com base nesta distribuição dimensional, os pedólogos usam expressões como pedregoso ou cascalhento, arenoso ou areento, limoso ou siltoso, argiloso ou barrento (3) e outras que expressam termos intermediários, como argilo-limoso, silto-argiloso, areno-limoso, areno-argiloso, saibrento, piçarroso ou areno-pedregoso, etc. Ainda do ponto de vista textural, um solo é qualificado de equilibrado quando não revela predominância de umas classes dimensionais sobre as outras.

A permeabilidade e a porosidade do solo e, consequentemente, a sua capacidade de retenção da água dependem grandemente da textura, o mesmo acontecendo com o seu comportamento químico e, daí, também com as respectivas aptidões agrícolas. Por seu turno, a textura depende da natureza da rocha mãe, da sua granularidade, da alterabilidade ou estabilidade dos seus minerais, do clima e, ainda, do pendor da superfície do terreno (declive).

Com a prática, o pedólogo consegue ter uma avaliação aproximada da textura do solo, esfregando uma pequena porção seca entre os dedos, operação que lhe permite averiguar da sua “aspereza” ou “macieza”. Fazendo este tipo expedito de ensaio com a terra molhada, avalia as suas qualidades adesivas e a sua plasticidade, que sabemos serem função do teor de finos (limo e  argila).

(1) Do latim rude-, grosseiro.

(2) Movimento desordenado das partículas de um líquido ou de um gás, mesmo em repouso, descrito pelo botânico escocês Robert Brown (1773-1853).

(3) De barro, termo pré-romano, com o significado de argila.

 

A.M. Galopim de Carvalho. É professor catedrático jubilado pela Universidade de Lisboa, tendo assinado no Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências desde 1961. É autor de 21 livros, entre científicos, pedagógicos, de divulgação científica e de ficção e memórias. Assinou mais de 200 trabalhos em revistas científicas. Como cidadão interventor, em defesa da Geologia e do património geológico, publicou mais de 150 artigos de opinião. Foi diretor do Museu Nacional de História Natural, entre 1993 e 2003, tempo em que pôs de pé várias exposições e interveio em mais de 200 palestras, pelo país e no estrangeiro.
Blogue: http://sopasdepedra.blogspot.com/