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FREI BETTO
ENTREVISTADO POR
MARIA ALZIRA BRUM LEMOS

Frei Betto termina o ano de 2003 em evidência, como coordenador da Mobilização Social do Programa Fome Zero, carro-chefe da política social do Governo, e como escritor, com o lançamento simultâneo, na Itália e no Brasil, pela Editora Garamond, de Gosto de Uva: escritos selecionados. Frei dominicano e militante dos movimentos sociais, filósofo e escritor, Frei Betto publicou ensaios, ficção, literatura infanto-juvenil e filosofia. Entre suas obras destacam-se Sinfonia universal: a cosmovisão de Teilhard de Chardin e Batismo de Sangue, obra que mereceu o prêmio Jabuti em 1985. Nesta entrevista, feita por telefone, ele falou sobre o livro e sobre seu trabalho.

Com vocês, Frei Betto.

O Sr. selecionou pessoalmente os textos de "Gosto de Uva". O que podemos esperar deste livro?

Gosto de Uva reúne artigos e ensaios que escrevi nos últimos anos. É uma seleção que visa proporcionar ao leitor uma reflexão sobre temas da atualidade, como ética, globalização, crise dos paradigmas, política e poder etc. É um livro com textos escolhidos para favorecer chaves de leitura das atuais conjunturas nacional e internacional, com forte conotação comportamental.

Como concilia campos que, muitas vezes, parecem contraditórios, como religião, militância política e atividade intelectual?

Cada um de nós é a unidade de vários campos de interesse e motivações distintas. No meu caso o que pode parecer cartesianamente excludente, como religião e política, tem sido, desde minha adolescência, muito bem articulado. Aprendi a não ideologizar a fé e a não confessionalizar a política. Sou discípulo de um prisioneiro político. Jesus Cristo não morreu na cama, mas condenado por dois processos políticos. Estou convencido de que o horizonte utópico da política se tece com os valores da fé cristã, como a dignidade de cada ser humano e a prioridade aos direitos dos pobres.

A Teologia da Libertação se mantém atual? O que representa Teologia da Libertação no século XXI?

Atualíssima. Há vinte anos a Teologia da Libertação trata de temas como globalização, dívida externa, exploração capitalista, colonialismo. Hoje o próprio Papa inclui estes temas em seus documentos e discursos. Não há nenhuma dúvida da atualidade da Teologia da Libertação, pois a situação mundial hoje exige da Igreja Católica maior sensibilidade às questões sociais.

O Sr. é um conhecedor de Cuba e escreveu um livro em que trata da relação entre Fidel Castro e a religião. O Sr. acredita no socialismo e na revolução socialista? Acha que são alternativas para o Brasil?

Não é pelo fato de a Igreja Católica ter promovido a Inquisição que renego seu valor e sua origem evangélica. Do mesmo modo, não é pelo fato de o socialismo ter cometido graves erros que ele deixa, a meus olhos, de ter valor como único sistema social capaz de promover a partilha dos bens da terra e dos frutos do trabalho humano.

Quem sai do Aeroporto de Havana depara-se com um outdoor estampado com a foto de uma bela criança cubana acompanhada da frase: “esta noite milhões de crianças dormirão nas ruas do mundo. Nenhuma delas é cubana”. Que outro país da América Latina ousa ostentar um cartaz como este?

No entanto, não considero Cuba um modelo para o Brasil. Teremos de construir nosso próprio modelo, preservando nossas idiossincrasias e valores.

O Sr. é o Coordenador do principal Programa Social do Governo, o Fome Zero. No que consiste o Fome Zero? Quais as principais iniciativas do Programa neste quase um ano de Governo?

Sou coordenador da Mobilização Social do programa que visa erradicar a fome de 44 milhões de brasileiros. Neste ano, em outubro, chegamos a beneficiar 1 milhão de famílias e, graças à unificação dos programas sociais pelo Presidente Lula, antes da passagem do ano, estarão beneficiadas 3 milhões e seiscentas mil famílias.

O Fome Zero não é um programa assistencialista. É um programa de inclusão social e conquista da cidadania e da auto-estima. Não é uma gincana de distribuição de comida. O programa oferece a cada beneficiário uma renda mensal e um conjunto de políticas públicas que inclui microcrédito, cooperativismo, saneamento, rcursos hídricos, alfabetização, restaurantes populares, de modo que o beneficiário possa gerar a própria renda. As informações completas estão no site do Programa www.fomezero.gov.br e podem também ser obtidas por telefone, pelo 0800 707 2003; as ligações são grátis, de segunda a sexta, das 8 da manhã às 8 da noite.

Quais suas principais metas enquanto coordenador do Fome Zero? O que gostaria de ter realizado quando deixasse o cargo?

Fazer com que o maior número possível de pessoas e a sociedade organizada abracem este mutirão de combate à fome.

Uma mensagem de fim de ano para seus leitores:

Neste Natal, menos Papai Noel e mais Menino Jesus. Mais importante do que dar presentes é se fazer presente junto àquelas pessoas excluídas ou que sofrem.