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OS SALVADORES DA CRUZ
arte: Hélio Rola / poema: Floriano Martins

 

O hálito do tempo remorde sua mais antiga inquietude:

quem serão os salvadores da Cruz? O que querem

de nós esses rostos famintos, soterrados na mansidão

com que esperam eternamente por algo? Por nós?

Serão tantos mesmo ou apenas um cujo rosto se disfarça

em milhares? Quem serão os salvadores da Cruz?

Trancafiados em seu olhar, de tão intensa recolha,

acabarão por nos encontrar em seu íntimo? Quantos

de nós? Seremos nós os salvadores da Cruz, sem

que ainda o tenhamos percebido? E se tirarmos dali

a Cruz, irão com ela tais enigmáticas figuras? Talvez

a devêssemos enterrar, cuidando para que não falte

um único rosto. Talvez a salvação esteja em desfazer-se

do objeto da dúvida. Mas quantos somos os inquilinos

da dúvida? Quantos os moradores de Deus que ainda

crêem que a salvação esteja na Cruz? Por que então

ainda a vemos pairando acima de todas as coisas?

Tudo está posto na exata medida, como uma ilusão.

Se olhar bem não há rosto algum na Cruz, ou razão

para salvá-la. Se olhar bem, somos os únicos

prisioneiros neste cenário vazio.