SÃO TOMÉ EM 1903 / RESUMO HISTÓRICO DA ILHA
JÚLIO HENRIQUES
19-07-2003 www.triplov.com

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Fig. 75 - Descasque das capsulas de cacau / Fig. 76 - Carregar os vagonetes com cacau

RESUMO HISTÓRICO DA ILHA

A ilha de S. Tomé parece ter sido descoberta em fins de Dezembro de 1470 por João de Santarêm e Pero de Escobar, cavaleiros da casa de El-Rei com os pilotos Martins Fernandes e Álvaro Esteves. É isto o que se julga como certo. Pelos nomes dados às ilhas se conhece a ocasião da descoberta delas. Assim se julga que aqueles navegantes tenham chegado a S. Tomé a 26 de Dezembro, dia dedicado pela Igreja ao apóstolo S. Tomé, assim como à de Ano Bom no primeiro de Janeiro e à de S.to António ou Antão a 17 de Janeiro de 1471.

Foram estas descobertas devidas ao contracto celebrado em 1469 sob Afonso V com Fernam Gomes, cidadão honrado de Lisboa, que tomou de arrendamento por cinco anos as terras e senhorios, que D. Henrique tinha legado ao Infante D. Fernando com obrigação de pagar por ano 200$00 e de descobrir anualmente 100 léguas na costa africana a partir da Serra Leôa.

Diz-se que a ilha era completamente deserta na ocasião da descoberta. Sabe-se que de 1485 a 1486 João de Paiva levou colonos para S. Tomé e que em 1493 a população aumentou tendo o Capitão Alvaro Caminha levado para lá os filhos dos judeus e degredados. Da ilha da Madeira foram tambem para S. Tomé muitos mestres para tentar a fabricação do assúcar. Em 1540 o naufrágio dum navio junto às - Sete pedras - perto de S. Tomé deu logar à entrada de negros de Angola, que se estabeleceram no Sul da ilha.

Desde 1550 já estava estabelecida a principal povoação, cidade episcopal com mais de 600 fogos, e na ilha havia uns 60 engenhos de assúcar, produzindo mais de 150 arrobas. Ali havia já muitos comerciantes portugueses, castelhanos, franceses e genoveses.

Até fins do século XVIII a vida da ilha foi extremamente acidentada por causas tanto internas, como externas. Assaltos e mesmo invasões de corsários e piratas por diversas vezes alteraram profundamente as condições da vida dos habitantes da ilha. Os angolares repetidas vezes fizeram incursões com o fim de roubar mulheres, e mais considerável foi a revolta dêstes em 1574 e ainda em 1595 nova revolta capitaneada pelo negro Amadôr. Alêm disto o incêndio da cidade, a discórdia quási permanente entre as autoridades civis e entre estas e as autoridades eclesiásticas, assim como o repetido abandôno por parte do govêrno central, notável durante o reinado dos Filipes, foram as causas principais do estado decadente a que chegou a ilha, que quási só era procurada por navios que necessitavam tomar água, ou receber alimentos. As culturas estavam despresadas porque os principais agricultores tinham emigrado para o Brasil.

O século XIX foi mais favorável à ilha. Em 1800 o governador João Baptista da Silva Lagos, mandando vir do Brasil semente de café, promoveu a cultura desta planta, que com extrema facilidade se desenvolveu. Em 1855 o benemerito João Maria de Sousa e Almeida, mais tarde Barão de Agua-Izé, promoveu com grande empenho a cultura do cacau, importando-o da ilha do Principe, para a qual do Brasil a tinha importado o governador Manuel. Ferreira Gomes.

Ao Barão de Agua Izé se deve igualmente a introdução do Artocarpus incisa árvore de grande utilidade pelos frutos (fruta pão) de notável qualidade alimentícia.

Nesta época começavam a dirigir os trabalhos agrícolas homens de grande actividade e iniciativa. Francisco de Assis Belard com Manuel Joaquim Teixeira lançaram o fundamento das roças S.ta Margarida, Monte Macaco, e Maiança; João M. de Sousa e Almeida os da roça Agua-Izé; Manuel José da Costa Pedreira os da Monte Café; José Maria de Freitas os da roça Bela Vista, Santarêm e Ilheu das Rolas. Os trabalhos encetados serviram de exemplo e muitos outros concorreram para o progresso agrícola da ilha. Entre êles é de justiça mencionar o brasileiro Dr. Gabriel de Bustamante, que lançou os fundamentos da roça Rio do Ouro, importando do Brasil, sua pátria, grande número de boas plantas e promovendo com cuidado as melhores culturas.

Não foi pequena a luta nestes primeiros tempos pela dificuldade de obter pessoal, pelas gravissimas epidemias de varíola, que reduziam profundamente o pessoal existente e ainda em 1875 a situação foi agravada com a publicação da lei que aboliu a escravatura em todas as colónias portuguesas.

Essa crise grave foi vencida e os agricultores continuaram a prosperar admiravelmente.

Os angolares, que por vezes incomodaram os agricultores, já em 1693 tinham sido metidos na ordem, estabelecendo-se regularmente na vila de S.ta Cruz, sendo Governador ou Capitão General Ambrósio Pereira de Berredo, que dêsse serviço encarregou o capitão dos matos Mateus Pires. Apesar disso o sul da ilha continuou improdutivo e os habitantes quási selvagens. Em 1878 sendo governador Estanislau Xavier de Assunção e Almeida, um novo conquistador dessa gente bárbara foi o Dr. Mateus Augusto Ribeiro de Sampaio, que tinha obtido por compra os vastos terrenos, que os angolares ocupavam. O Dr. Sampaio, destemido e valente, com alguns amigos e limitado pessoal desembarcou na baía de S. João, tomou posse dos terrenos, neles se instalou, arroteou as terras, abriu caminhos, civilisando a população negra, que hoje presta serviços de valor na exploração agrícola.

A ocupação dos Angolares foi um dos actos mais notaveis da história da ilha.

A prosperidade crescente da ilha tem-lhe creado inimigos, que sob pretextos humanitários não se tem cansado de lhe promover guerra de descredito. Infelizmente - entre portugueses traidores houve algumas vezes - que secundaram êsse movimento.

Os progressos agricolas fizeram a ilha conhecida e homens de sciência a visitaram para a estudar. O primeiro foi C. Weiss que em 1847 nela fez explorações; em 1855 e 1861 o Dr. F. Welwitsch; em 1862 os ingleses Don e G. Mann, chegando êste a fazer a ascenção ao Pico, no que não deveria ter encontrado pequenas dificuldades. O Dr. H. Dohrn lá esteve em 1865, e o professor R. Greeff esteve no ilheu das Rolas em 1879 e 1880, fazendo repetidas excursões pela ilha e conseguindo optimos resultados. Ultimamente em 1905 os naturalistas franceses Ch. Gravier e Ch. Chevalier fizeram ricas colheitas de produtos naturais, que serviram de base a publicações importantes.

Não teem sido só os estrangeiros que se teem ocupado do estudo da ilha. Em 1885 o Dr. Adolfo Moller, jardineiro chefe do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, na ilha permaneceu por alguns meses fazendo colheitas valiosas tanto de plantas, como de animais.

Estes trabalhos de exploração botânica foram contimlados com optimos resultados pelo Sr. Francisco J. Dias Quintas. De produtos zoológicos fez tambem boas colheitas o falecido naturalista F. Newton.

Nos últimos tempos o engenheiro Sr. Ezequiel Campos, que teve de percorrer grande parte da ilha no serviço de levantamento de plantas dalgumas roças, recolheu alguns exemplares botânicos e reuniu muitos elementos sobre a orografia e geologia da ilha.

O que está feito em relação ao estudo dos produtos naturais da ilha é já considerável, mas o que há a fazer será de certo muito mais, e pena é que tal estudo não seja continuado.