Quando uma multidão ou um
simples grupo de pessoas se dirige num dia certo do ano a um lugar
sagrado, faz essa viagem por etapas e, depois de andar em volta do
santuário, se diverte entre sol e pó num arraial, podemos dizer que
temos então uma romaria.
No livro «Júlio César
Machado no Oeste» organizado por Vítor Wladimiro Ferreira (edição Museu
Municipal do Bombarral) surgem as Festa das Nazaré que são afinal no
Sítio, lugar onde aconteceu o milagre de D. Fuas Roupinho. O texto é de
1861: «Já lá vêm cobrindo a estrada, os círios uns após outros!
Deixemo-lo entrar, o grande Círio da Prata Grande! Depois dele virá o
das Caldas e, depois do das Caldas, chegará à noite o de Óbidos,
descendo brilhantemente as serranias da Pederneira e alumiando a Nazaré
ao clarão dos seus archotes! A romaria desfilava pela praça e girava
três vezes em roda da igreja. A música rompia a marcha e os anjos
encetavam o cortejo. São três crianças de calção de meia, manta bordada
e gorro de paladino que se aguentam em cima dos seus cavalos e guardam
os pés em enormes estribos de pau. O povo ajoelha, escuta e aplaude. É
fabuloso o número de criaturas que se arrastam de joelhos pela praça!
Pelo adro! Pela igreja!»
No livro «Senhor Santo
Cristo dos Milagres» de Paula Simões (edição ELO) as fotos de Carlos
Garcia registam a romaria que tem lugar em Ponta Delgada todos os anos,
cinco semanas após a Páscoa. Iniciada em 11 de Abril de 1700 depois de
diversos abalos sísmicos na ilha de São Miguel, a procissão com a imagem
do Senhor Santo Cristo sai do Convento da Esperança , contorna o Campo
de São Francisco, cruza as Porta das Cidade, passa ruas e largos até se
recolher na igreja de São José onde aguarda a celebração da missa no
domingo a seguir. O som das filarmónicas sela a emoção das promessas que
ligam dois mundos: o do Céu e o da Terra.
O livro «Feiras Mercados
e Romarias em Portugal através do Bilhete Postal Ilustrado» (edição
ECOSOLUÇÔES) corresponde a uma exposição do Museu da República e da
Resistência, organizada por João Mário Mascarenhas e comissariada por
Pero Barbosa. De Melgaço a Tavira, de Espinho a Elvas, da Ericeira a
Castelo Branco, os postais ilustrados provam como é forte a relação
entre o fenómeno religioso e a feira: «É aqui que mais genuinamente se
mistura o profano e o sagrado na simplicidade da alma e cultura
populares, onde o cheiro da maçã camoesa se confunde com o odor dos
círios prometidos em hora de má sorte (…) A meio da tarde sai a
procissão. Por um percurso que tem a extensão dos séculos, regressando
ao altar. E a restante celebração é festa e arraial, onde as vozes das
gentes se apagam no estralejar dos foguetes e morteiros, no afagar
discreto dos corpos ao ritmo da banda que abafa os gritos da euforia e
as lamentações espontâneas.»
No livro «Um olhar
português» (edição Círculo de Leitores) com fotos de Jorge Barros se
incluem diversos textos de vários escritores portugueses: João de Melo,
Viale Moutinho, Lídia Jorge, Al Berto, Mário Ventura, José Cardos Pires,
Hélia Correia, Eugénio de Andrade, Fernando Dacosta, Mário Cláudio,
Francisco José Viegas e Regina Louro. Fernando Assis Pacheco (1937-1995)
assina um texto sobre a romaria de Agosto no Senhor da Serra: «Às dez da
manhã de um dia de Abril de 1991, levado a passeio por Felisberto Lemos,
o amigo livreiro e preclaro cidadão de Coimbra, subi ao lugar de Vendas
de Ceira para o Senhor da Serra com a esperança de que lá no alto fosse
tudo como eu imaginava: uma igreja camponesa, um largo com um café e um
mirante, cães abanando o rabo, solícitos, bons compadres; a um canto a
carreira, acabada de chegar.» Depois de uma passagem pela casa que foi
de João José Cochofel onde outro poeta o visitava (José Gomes Ferreira),
o poeta e jornalista Fernando Assis Pacheco prossegue: «O bloco-notas
garante que na cercadura da igreja, aliás santuário – sejamos rigorosos
com a História – estão cinco bancos de pedra, todos eles e cada qual de
um com o seu santo episódio descrito em azulejaria: Milagre que fez o
Senhor da Serra a Miguel Maria Antunes no ano de 1852…Que fez a Manoel
dos Santos, o Velho no lugar do Zambujal, no ano de 1850… A Manoel
Martins, do lugar de Rojela, no ano de 1837.» |
JOSÉ DO CARMO
FRANCISCO (Santa Catarina, Caldas da Rainha,1951).
Prêmio
Revelação da Associação Portuguesa de Escritores. Colaborou no
Dicionário Cronológico de Autores Portugueses do Instituto Português do
Livro. Poeta. Possui uma antologia da sua poesia publicada no Brasil.
Jornalista, colaborou entre outros em "A Bola", "Jornal do Sporting",
"Remate", "Atlantico Expresso"...
Autor de "Universário",
"Jogos Olímpicos", "Iniciais", "Os guarda-redes morrem ao domingo",
etc., bem como de antologias como "O trabalho", "O desporto na poesia
portuguesa e "As palavras em jogo", entre outras.
É secretário
da Associação Portuguesa de Críticos Literários. Vive em Lisboa.
Contacto: jcfrancisco@mail.pt
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