Tomás António Gonzaga
Marília de Dirceu
Parte 1
Lira XXXI

Minha Marília,
Se tens beleza,
Da Natureza
É um favor.
Mas se aos vindouros
Teu nome passa,
É só por graça
Do Deus de amor,
Que tanto inflama
A mente, o peito
Do teu Pastor.

Em vão se viram
Perlas mimosas,
Jasmins, e rosas
No rosto teu.
Em vão terias
Essas estrelas,
E as tranças belas,
Que o Céu te deu;
Se em doce versos
Não as cantasse
O bom Dirceu.

O voraz tempo
Ligeiro corre:
Com ele morre
A perfeição.
Essa, que o Egito
Sábia modera,
De Marco impera
No coração;
Mas já Otávio
Não sente a força
Do seu grilhão.

Ah! vem, ó Bela,
E o teu querido,
Ao Deus Cupido
Louvores dar;
Pois faz que todos
Com igual sorte
Do tempo, e morte
Possam zombar:
Tu por formosa,
E ele, Marília,
Por te cantar.

Mas ai! Marília,
Que de um amante,
Por mais que cante,
Glória não vem!
Amor se pinta
Menino, e cego:
No doce emprego
Do caro bem
Não vê defeitos,
E aumenta quantas
Belezas tem.

Nenhum dos Vates,
Em teu conceito,
Nutriu no peito
Néscia paixão?
Todas aquelas,
Que vês cantadas,
Foram dotadas
De perfeição?
Foram queridas;
Porém formosas
Talvez que não.

Porém que importa
Não valha nada
Seres cantada
Do teu Dirceu?
Tu tens, Marília,
Cantor celeste;
O meu Glauceste
A voz ergueu;
Irá teu nome
Aos fins da terra,
E ao mesmo Céu.

Quando nas asas
Do leve vento
Ao firmamento
Teu nome for:
Mostrando Jove
Graça extremosa,
Mudando a Esposa
De inveja a cor;
De todos há de,
Voltando o rosto,
Sorrir-se Amor.

Ah! não se manche
Teu brando peito
Do vil defeito
Da ingratidão:
Os versos beija,
Gentil Pastora,
A pena adora,
Respeita a mão,
A mão discreta,
Que te segura
A duração.