Revista TriploV de Artes, Religiões & Ciências .
ns . nº 55 . dezembro 2015 . índice


A.M. Galopim de Carvalho (Portugal). Geólogo e ficcionista.
Professor jubilado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

A.M. GALOPIM DE CARVALHO

A propósito da passagem do 2015 TB145

 
 

No passado Sábado, 31 de Outubro, passou “muito perto” (astronomicamente falando) de nós a uma velocidade estimada à volta de 35 km/s (126 000 km/h), o corpo celeste  registado como “2015 TB145”. Com cerca de 600 m de diâmetro, este “rochedo” passou, dizia a notícia divulgada pela NASA, a uns 486 000 km da Terra, bem para lá da órbita do nosso satélite. Interpretado como o núcleo rochoso de um cometa que, nas sucessivas passagens pelo Sol, acabou por perder os componentes voláteis que os caracterizam nas suas habituais cabeleira e cauda é, como foi referido, um cometa-morto.

Foi Aristóteles (310 a.C.-230 a.C.) quem primeiro se referiu a estes corpos celestes, referindo-os por “kométés”, o que quere dizer estrelas com cabeleira. 

A queda na Terra de corpos vindos do espaço e que, uma vez caídos, passamos a designar por meteoritos, tem sido uma constante ao longo da sua história de cerca de mais de 4500 milhões de anos (Ma). Entre estes corpos uns são asteróides, outros são núcleos rochosos de cometas e outros, ainda, os seus fragmentos. Particularmente intensas nos primórdios do nosso planeta, estas quedas são, relativamente, pouco numerosas no presente. Uma tal intensidade nesses recuados tempos pode ser concretizada ao observarmos a superfície selenita, pejada de um sem número de crateras de impacte meteorítico que conserva, praticamente intacta, uma memória de milhares de milhões de anos. Destituída dos factores que, na Terra, provocam a erosão do relevo, a Lua mostra uma paisagem de há muito desaparecida no nosso planeta. As numerosíssimas e boas imagens de que hoje dispomos dos planetas e seus satélites e de diversos asteróides provam que sofreram um violento e prolongado bombardeamento por parte dos mais variados corpos, alguns de dimensões quase planetárias, deslocando-se a velocidades de dezenas de quilómetros por segundo. Um tal bombardeamento teve lugar nos primeiros milhares de milhões de anos do Sistema Solar, tendo provocado, por assim dizer, uma “limpeza do espaço”. Esta expressão que, em poucas palavras, quer dizer que, na imensa maioria, os corpos sólidos não integrados na formação dos planetas (os que permaneciam dispersos no espaço interplanetário e, como eles, a gravitarem em torno do Sol) atraídos pelo campo gravítico dos corpos maiores (os planetas e os seus satélites e asteróides) mergulharam neles, produzindo as inúmeras crateras de impacto que podemos ver em todos. Segundo esta interpretação, o espaço ficou “limpo” e, daí, a relativamente pequena ocorrência de quedas meteoríticas nos tempos mais recentes.

Os vestígios na Terra desse impactismo antigo foram completamente apagados, sobretudo, devido à erosão. Mas, como se disse atrás, ficaram conservados no nosso satélite, que pode ser visto como um “museu do Sistema Solar”.

Um outro grande acontecimento relacionado com a colisão de um corpo sólido com a Terra, terá estado na base da origem do nosso satélite. A teoria do “Grande Impacte”, numa formulação conjunta dos investigadores do Instituto de Ciências Planetárias de Tucson (Arizona, EUA) e do Instituto Harvard-Smithsonian de Astrofísica, defende que, há cerca de 4500 Ma, durante as primeiras fases da sua formação, o nosso planeta terá sofrido o impacte de um corpo do tamanho de Marte (que baptizaram de Thea, a deusa pré-helénica da luz e mãe do Sol e da Lua) de que resultou e ejecção de material dos dois corpos para uma órbita em torno do maior (a Terra) onde acrecionou, originando a Lua.

São relativamente escassos os vestígios deste tipo de quedas (astroblemas) que chegaram até nós. Um dos mais recentes é a conhecidíssima e bem conservada cratera do Meteoro, no Arizona (EUA), com mais de 1000 m de diâmetro, provocada por um corpo com cerca de 50 m de diâmetro. Este magnífico testemunho de uma colisão ocorrida há uns 50 000 anos, é também conhecido por cratera Barringer, em homenagem ao geólogo americano Daniel Barringer (1860-1929) que o identificou com tal. Entre os mais antigos astroblemas destaca-se o de Manicouagan, no Quebeque (Canadá), testemunho de uma cratera com cerca de 100 km de diâmetro, resultante da colisão de um corpo de diâmetro estimado em 5 km, ocorrida há cerca de 215 Ma.

Estima-se em milhares de milhões o número de asteróides ainda a vaguearem no espaço correspondente ao Sistema Solar, desde as partículas de dimensão das areias aos mais gigantescos, como Ceres, classificado em 2006 como planeta-anão. A grande maioria gravita entre as órbitas de Marte e de Júpiter, constituindo a chamada Cintura de Asteróides.

Incontável é, ainda, o número de cometas, muitos deles com um núcleo rochoso, localizados num vastíssimo conjunto exterior à órbita de Plutão conhecido por Nuvem de Orth. Sempre que, por acção gravítica do astro-rei, um destes corpos ou um seu fragmento penetra na região central do Sistema Solar, fá-lo segundo uma órbita elíptica muito alongada, podendo passar muito próximo da Terra, como aconteceu com o referido cometa-morto que, há dias, passou por nós, ou colidir com ela e, neste caso, teríamos tido aqui um impacte meteorítico de efeitos altamente destruidores.

A queda, há 65 Ma, em Chicxulub (península de Iucatão, no México) de um outro grande corpo, com o dobro do tamanho do “2015 TB145”, produziu uma cratera de cerca de 200 km de diâmetro. Esta ocorrência é interpretada, pela grande maioria dos estudiosos, como a causa da extinção em massa, na qual se admite terem desaparecido cerca de três quartos das plantas e dos animais de então, numa catástrofe à escala planetária que marca a fronteira entre o final da era mesozóica e o início da cenozóica. Para se ter uma ideia da dimensão de um corpo (asteróide ou núcleo de cometa) como o que sustenta esta interpretação, imaginemo-lo pousado no fundo do oceano. Nesta imagem, a parte emersa tem a grandiosidade de uma montanha mais imponente de que os Alpes.

 

Imagem de radar do 2015 TB145, obtida pelo
Observatório de Arecibo (Porto Rico)

 
 
 
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