MIGUEL GARCIA

Francisco Miguel Gouveia Pinto Proença Garcia
ANÁLISE GLOBAL DE UMA GUERRA
(MOÇAMBIQUE 1964-1974)

Dissertação para a obtenção do Grau de Doutor em História
Universidade Portucalense
Orientação dos: Prof. Doutor Joaquim da Silva Cunha e
Prof. Doutor Fernando Amaro Monteiro
Porto . Outubro de 2001

I Capítulo
Os grandes poderes mundiais e as suas ambições em África

1. Os grandes poderes mundiais e a África. O Acto Geral da Conferência de Berlim. A partilha de África.

Quando os Portugueses entraram em 1497 no Oceano Índico defrontaram-se com os árabes muçulmanos que se infiltravam para Sul, a partir do Mar Vermelho ou da Pérsia, apoiando-se na Costa Oriental da África em ilhetas adjacentes ou nas testas dos caminhos que da beira-mar largavam para o interior, e, assegurando o domínio da região a partir daí, detinham o controlo de todo o comércio com os nativos. Era intenção dos portugueses substituir a sua influência económica e política. Assim, navegantes exploradores portugueses depressa ocuparam enclaves e ilhas onde aqueles se encontravam, passando a garantir a sua supremacia naval na África Oriental pela presença em Melinde desde 1498, Quíloa, Mombaça e Sofala em 1505, Ilha de Moçambique em 1506. Esta última era o principal ponto de apoio, naquelas paragens, das armadas com destino à Índia.

Nos inícios do século XVII, os domínios portugueses na África Oriental ao Sul do Rovuma resumiam-se às pouco numerosas povoações das ilhas costeiras de Quirimba, Moçambique e Sofala e às de Tete e Sena, com os seus prazos circunstantes e subsequentes até à foz do Zambeze (1). A esparsa colonização do território devia-se não à Coroa, mas aos feitos e ousadias dos colonos. O Governo Português, representado por um capitão-general da capitania de Moçambique e Rios de Sena, dependente do governador da Índia, estava sediado na Ilha de Moçambique, e a sua jurisdição abarcava Inhambane, Sofala e ilhas do Cabo Delgado.

Moçambique estava tradicionalmente ligado às redes comerciais do Oceano Índico. Naquela Costa africana, a ligação com a Índia e o domínio comercial de Moçambique, Damão e Diu era assegurada pelos mercadores Baneanes de Cambaia, organizados na Ilha onde iniciaram a sua actividade em 1686, numa poderosa firma com o nome de Mazanes. Depois, foram passando à terra firme e alargando a sua presença e negócios.

Toda aquela Costa - onde a presença portuguesa ainda não estava consolidada - era muito vulnerável. Nenhuma povoação estava segura; talvez, só a Ilha estivesse a salvo de algum ataque. No limiar do século XVIII, os ingleses desembarcaram nas vizinhanças de Sofala (1721) e os holandeses chegaram a levantar paliçada em Lourenço Marques ( 1721 a 1730) e a ocupar a baía de Inhambane (1725 e 1731). Os austríacos também aportam em Lourenço Marques, com a Companhia Asiática do Trieste (1777). Era forçoso contrariar aquela situação através de um processo de ocupação não só militar como comercial (2).

A actividade portuguesa na África Oriental foi, assim, iniciada em princípios do século XVI, desejando a Coroa controlar o comércio do ouro entre a África Central e a Ásia, ouro que foi substituído pelo marfim e depois pelo tráfico negreiro, que ganhou destaque no princípio do século XIX, com as exportações para as possessões francesas do Índico, Brasil, Antilhas Hispânicas e América do Norte.

Pelo decreto de Sá da Bandeira de 10 de Dezembro de 1836, foi oficialmente abolido o tráfico escravo. A Inglaterra abolira-o em 1807 e, em 1815, por Tratado com Portugal, limitou-se este ao Sul do Equador. Diversas medidas posteriores foram tomadas para acabar de vez com o tráfico, como a promulgação de um decreto a 25 de Fevereiro de 1869 e, mais tarde ainda (1878), do Código do Trabalho. Todos estes decretos caíram no vazio, pois Moçambique, nomeadamente o extremo Norte do território, seria dos locais onde esta actividade persistiria até mais tarde em África, provavelmente até 1914, fosse ela assumida pelo Imã de Mascate ou, posteriormente pelo Sultanato de Zanzibar.

Foi pelo acompanhamento do tráfico de escravos que os europeus foram penetrando com as suas autoridades, conhecimentos e planos económicos no interior de África. E foi o interesse nesse mesmo tráfico nos séculos que precederam a descoberta das minas de ouro, diamantes e cobre (fins do séc. XIX) que, em parte, estimulou as comunicações marítimas e terrestres com Moçambique.

O tráfico levado a efeito ilegalmente originou diversos incidentes diplomáticos, do qual se destaca a apreensão em águas territoriais moçambicanas, a 29 de Novembro de 1857, da barca francesa "Charles et Georges", acusada de transportar escravos de Angoche para a ilha de Reunião. Esta atitude das autoridades portuguesas originou um célebre ultimatum da França a Portugal, que este foi compelido a aceitar (1857).

No início do séc. XIX, o Governo Português estava assoberbado de preocupações: eram as campanhas do Rossilhão, as invasões francesas e o Rei retirado para o Brasil. Depois, a independência deste território a 7 de Setembro de 1821, a guerra civil e a implantação e sequente estabilização do Regime liberal. Assim, mal podia atender aos problemas ultramarinos, onde, em Moçambique, na sequência da independência do Brasil - com quem tinha relações estreitas - , também surgiu um movimento de revolta contra as autoridades portuguesas e se manifestou o desejo de união com o Brasil (3). Por outro lado, os Angonis (Vátuas, na terminologia portuguesa oitocentista) de Sochangane (Manicusse), em fuga a Chaca, avassalaram todas as tribos até ao Zambeze, estabelecendo a sua Corte ou “Gasa” no Bilene.

A estes elementos podemos associar outros, como a seca, o tráfico de escravos e o banditismo, que, inextrincavelmente ligados e “(...) potenciando-se mutuamente, formaram nas décadas de 1830 e 1840 uma conjugação específica e explosiva que destruiu os sistemas políticos e sociais da área moçambicana. Daí resultou a profunda erosão do domínio informal exercido pelo Estado colonial na Zambézia; enquanto que ao longo da Costa, o contrabando de escravos, florescente, propiciou a autonomização dos xeques e régulos até então ligados por acordos tácitos às autoridades portuguesas (...)”(4). Nesta época, efectuavam-se já acções de reconhecimento preparatórias para o assalto ao Continente, pelos “grandes da Europa”, no final do século.

Após a instauração do Regime liberal, o domínio português nas Costas de África voltadas ao Índico traduzia-se numa estreita faixa, ao longo do litoral, tendo início na baía de Tungue, ilhas Quirimbas, passando pela Ilha de Moçambique e Costa fronteira, com frequentes soluções de continuidade até Quelimane e barra do rio Zambeze, aqui penetrando pelo continente dentro, subindo o rio até Tete; da foz deste rio para Sul, encontrava-se Sofala, Inhambane e Lourenço Marques.

No séc. XV, algumas nações europeias disputavam a consolidação de posições costeiras em África e não uma real e efectiva ocupação do hinterland desconhecido. O Continente Africano não era objectivo prioritário, organizando-se apenas a instalação, em certos pontos considerados estratégicos, de postos fortificados, que tinham como primordial função servir de escala, apoio e feitorias. A segunda metade do século XIX indica um novo rumo, passando aquele Continente, por motivos de diversa ordem, desde os religiosos e humanitários, aos económicos, estratégicos, de mera curiosidade científica, mas sobretudo devido a uma mutação do sistema internacional (5), a ser uma zona de confluência das potências europeias.

Sob pressão da opinião pública, motivada pelas explorações dos viajantes como Stanley e Livingstone, que revelaram aspectos do interior do continente até aí geralmente ignorados, e sob o estímulo do desenvolvimento económico e tecnológico das definições subsequentes ao triunfo do Liberalismo e à Revolução Industrial, o Continente Africano passou assim a representar um cenário de rivalidades e interesses das grandes potências, às quais interessava o controlo das riquezas e de um mercado em território africano, mas sobretudo para impedir que os rivais se antecipassem e preenchessem o vazio (6). Nesta ordem de ideias, para fazer face às exigências de espaços de recurso e para alastramento, formularam a expansão ultramarina como uma missão civilizadora.

A redescoberta de África, depois das independências americana e brasileira, foi um fenómeno complexo, que não partiu dos governos nem obedeceu a grandes estratégias previamente definidas. A expansão para dilatação da Fé ou por motivos económicos levou os portugueses a colaborarem decisivamente no processo de colonização. A França desenvolvia na África Ocidental e Central um metódico plano de acção “(...) em que as considerações de prestígio desempenhavam um papel mais importante que os interesses económicos (...)”(7). A Grã-Bretanha tinha interesses económicos e estratégicos um pouco por todo o planeta, embrenhava-se em todos os sítios, quer para proteger posições adquiridas, quer na procura de novos campos de acção. Na África do Sul, os seus planos eram dirigidos para as explorações diamantíferas e jazidas de ouro do Transval e Orange, ameaçando os interesses financeiros alemães, e para o cobre da Rodésia. Esta redescoberta de África provocou uma afluência de emigrantes europeus de espírito aventureiro na procura de realizar fortunas fabulosas (8).

Leopoldo II da Bélgica, sob o explícito pretexto de promover a civilização na África Austral e procurando travar o plano de expansão inglês, convocou para Bruxelas, em 1876, uma conferência geográfica para a qual Portugal não foi convidado. Assim, no dia 12 de Setembro de 1876, com o aparente objectivo de penetrar em África com fins científicos e humanitários, fundou, em Bruxelas a Associação Internacional Africana, que acabou por servir o desejo belga de alcançar a posse do Congo.

Os Franceses, por intermédio do explorador Brazza, também disputavam a exploração do Congo. A margem direita do Zaire, no Stanley Pool, foi alcançada por Brazza a 1 de Outubro de 1880, fundando um posto no local onde hoje existe Brazzaville. A Bélgica, através de Stanley, só aí chegou em 27 de Julho de 1881, ficando, assim, limitada à margem esquerda do rio.

Bismark, nos seus quase vinte anos de Chanceler, praticou uma Realpolitik que transformou a política externa alemã numa competição de forças, mas não provocou qualquer desafio na Europa “(...) que originasse uma preocupação britânica pelo equilíbrio e manteve a Alemanha fora da corrida colonial (...)”(9). Todavia, a Alemanha, em 1883, entra na corrida para África, mas pela mão dos particulares. Estes pelo menos aparentemente, tomam a iniciativa de conquistar posições que o Governo Imperial acederá depois a reconhecer e proteger. Em pouco mais de um ano, adquire o Sudoeste Africano Alemão (actual Namíbia), estabeleceu protectorados no Togo e Camarões e, em apenas cinco semanas, funda a colónia da África Oriental Alemã (integrante da actual Tanzânia).

A 10 de Novembro de 1875, cria-se em Portugal a Sociedade de Geografia de Lisboa, base principal do expansionismo português. Porém, os exploradores portugueses só em Julho de 1877 partem de Benguela. Separaram-se no Bié em duas missões que vão atravessar o continente. Serpa Pinto vai até Durban, e Roberto Ivens e Hermenegildo Capelo seguem até Iaca, ao Norte. Destas explorações não resultou nenhuma ocupação efectiva.

O ideário expansionista português contou com os apoios do movimento republicano, de algumas indústrias e empresas comerciais e financeiras interessadas em África “(...) propulsionadas pelo Estado e protegidas por pautas aduaneiras e privilégios de outra ordem (...)”(10), apesar de o pensamento colonial procurar mais a salvaguarda dos direitos históricos sobre o imenso sertão do que a construção de um império económica e moralmente forte.

Os expedicionários foram seguidos pelas missões religiosas, nomeadamente as protestantes, que se instalaram preferencialmente nas colónias que eram controladas pelas suas nacionalidades de origem; porém, ao abrigo da liberdade religiosa, bem depressa se espalhavam nas colónias de outros países. Mas, sem dúvida que foram os militares, nomeadamente no século XIX e meados do século XX, que tiveram um papel de primazia no processo de colonização, ocupação e pacificação dos territórios ultramarinos, predominância devida à ausência “(...) ou quase ausência de outras forças sociais do que propriamente a uma vontade deliberada por parte dos militares em assumirem esse papel de relevo (...)”(11).

Portugal, com base num direito histórico, reivindica a posse do Congo, onde se encontrava concentrado todo o comércio da região, colocando-se em situação embaraçosa, face às iniciativas belgas.

O Governo Português não possuía apoio diplomático capaz para fazer face aos ataques belgas, nem as colónias tinham acção militar e forças próprias; as ordens religiosas haviam desaparecido e a “(...) Propaganda Fidei, dirigindo com carácter internacional as Missões, já de si contrariava a acção portuguesa de carácter nacionalista, procurando não só reduzir a acção de Portugal no Oriente, como introduzir estrangeiros nas restantes colónias (...)”(12).

A preocupação inglesa perante as atitudes desenvolvidas pelas outras potências europeias com interesses coloniais foi notória. Adoptando uma táctica de antecipação, Londres prontifica-se a negociar com Portugal um tratado no qual fosse encontrada uma solução quanto à região do Congo, estabelecendo-se na zona uma defesa para evitar a penetração de outras potências e, ao mesmo tempo, desta forma, retaliar a Alemanha e a França.

O Governo Britânico, que propôs negociações, face a pressões de outras potências, acabou por recuar. Portugal ocupou militarmente Ponta Negra. Esta situação conduziu ao abandono pela parte da Inglaterra de algumas das anteriores objecções e levou-a a aceitar a autoridade portuguesa nas regiões contestadas, assinando com Portugal, em 26 de Fevereiro de 1884, o Tratado do Zaire.

Com a alegação de que os direitos históricos e antiquíssimos de Portugal naquela área eram desprezíveis, a assinatura deste Tratado foi, de imediato, contestada pelas opiniões públicas inglesa, francesa, alemã, holandesa, espanhola e, inclusivamente, pela norte-americana, levando a Inglaterra a condicionar a ratificação do Tratado até que as objecções desses países fossem ultrapassadas. Com o intuito de resolver a situação, Barbosa du Bocage, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, lança a ideia da realização de uma conferência internacional entre as principais potências europeias (Maio de 1884). Mas é Bismarck quem, recusando-se a reconhecer o tratado do Zaire, apenas bilateral, vai tomar a iniciativa e, com o apoio da França, convoca uma conferência internacional para Berlim, nesse mesmo ano.

Assim, consideramos que a revisão do Direito Internacional, referente à ocupação dos territórios coloniais, se deveu à pressão das potências que se tinham mantido alheias ao fenómeno colonial (Alemanha) ou que apenas procuravam afastar “embaraços jurídicos” à sua expansão (Inglaterra)(13).

A Conferência de Berlim, realizada de 15 de Novembro de 1884 a 26 de Fevereiro de 1885 (16), marcou “(...) o início do arranque final para a completa submissão do globo ao governo ocidental (...)”(17); aqui, a Europa obteve autorização para «ocupar» a África. Entre outros assuntos, em Berlim introduziram-se nas relações internacionais regras uniformes relativas às ocupações que poderiam, no futuro, verificar-se nas Costas do Continente Africano.

Durante a Conferência, que serviu para consagrar o advento da corrida a África, prevaleceu uma tese inovadora, que só reconhecia o domínio de quem mantivesse uma ocupação permanente e efectiva nas Costas do Continente. Aquela ocupação passou assim a substituir os direitos históricos, definindo-se desta forma um novo direito público colonial, como podemos confirmar no Cap. VI do Acto Geral de Berlim (18), de que constam as disposições mais bizarras. Assim refere o Artº. 34º : “(...) A Potência que de futuro tomar posse de um território nas Costas do Continente Africano situado fora das suas habituais possessões (...) e igualmente a Potência que num desses territórios vier a assumir um protectorado acompanhará o respectivo acto de uma notificação às outras potências (...)”, definindo o Artº. 35º a efectividade da ocupação pela “(...) existência de autoridade suficiente para fazer respeitar os direitos adquiridos e eventualmente a liberdade de comércio e de trânsito nas condições em que for estipulada (...)”.

Subentendia-se que a ocupação exigida da zona costeira reservava, para a nação ocupante, o respectivo hinterland. Todavia, não era possível delinear fronteiras de um continente cujo interior, por falta de meios tecnológicos, se encontrava desprovido de um estabelecimento significativo de europeus, sendo, assim, praticamente desconhecido.

A definição do novo direito público colonial da ocupação efectiva feita em Berlim acabou por se traduzir numa declaração de guerra da Europa a África, pois as potências europeias tiveram de recorrer a efectivos armados para fazerem valer os seus interesses e demarcarem as suas esferas de influência. Lembramos que, nesta época e circunstância, a luta que se travava em África era exclusivamente entendida entre potências coloniais europeias, dado que não eram tidos em linha de conta quer os interesses quer as estruturas africanas.

Em Berlim, o interior da África não foi dividido pelas potências coloniais europeias, mas o direito colonial, aí aprovado, não possibilitou a concretização do tratado do Zaire. Portugal viu gravemente afectados os seus interesses em África. Perdeu não os direitos à margem Norte do Congo (onde ficou apenas com o enclave de Cabinda), mas a partilha da região feita paralelamente à Conferência e, através de um esforço hercúleo, enviou tropas e funcionários para todos os territórios que considerava seus por direito histórico. Se, em Tordesilhas, Portugal foi a delegação mais bem documentada para negociar, em Berlim, foi com certeza a mais deficientemente apetrechada, pois não possuía Informações estratégicas com capacidade de apoiar os órgãos decisores de então (19).

O facto de estarem presentes na Conferência potências não coloniais e não europeias, como os Estados Unidos da América, denota que o problema colonial tendia cada vez mais a deixar de ser considerado como assunto cingido aos interesses das potências colonizadoras, para passar a ser encarado como matéria relativa à expansão cultural e comercial das nações civilizadas (20). Os EUA expressaram, aqui, o seu sentimento anti-colonial, ao pretenderem ver reconhecido o direito dos povos indígenas de disporem de si próprios e do seu território, bem como de ser solicitado aos mesmos o consentimento para ocupação do território. Um século depois, isto reflectiu-se na posição anti-colonialista no seio das Nações Unidas e no apoio directo ou dissimulado a movimentos independentistas.

Berlim não conseguiu pôr cobro à escravatura, e a intervenção livre dos missionários também foi ineficaz. Assim, reuniu em 1890 a Conferência Internacional de Bruxelas para, mais uma vez, se tentar pôr termo ao tráfico de escravos e regular o comércio de armas e bebidas alcoólicas em África (21).

O resultado final de Berlim, pretendido pela Alemanha, no fundo, traduziu-se pela consolidação da sua presença no Continente Africano, mas sem entrar em conflitos com a Inglaterra.

Uma segunda fase de explorações portuguesas (1884-1887) (22), coordenadas pelo Ministro da Marinha e Ultramar, Pinheiro Chagas, com o objectivo bem definido de reafirmar os direitos portugueses adquiridos na zona em disputa com a Inglaterra, foram de suma importância para a assinatura dos futuros tratados com a França e a Alemanha. Na realidade, as viagens de exploração deste período foram verdadeiras corridas aos tratados, pois era necessário definirem-se as fronteiras das diversas possessões com as confinantes, bem como das respectivas esferas de influência.

Barros Gomes, Ministro dos Negócios Estrangeiros, apresentou à Câmara dos Deputados a consagração pública e oficial das pretensões portuguesas na África Austral, plano horizontal, contrário ao plano expansionista vertical, preconizado por Cecil Rhodes, de unir o Cabo ao Cairo. O ministro pretendia realçar o interesse português no país dos Matabeles, por forma a obter contrapartidas quando cedesse em negociações.

Os Governos de Paris e Lisboa acordaram negociar a problemática das suas fronteiras comuns (Março de 1885), nomeadamente do Congo com Cabinda, e delimitar bem a Guiné Portuguesa, fronteira com o Senegal e Guiné Francesa.

O pensamento português de unir Angola a Moçambique, do Bié ao Zambeze, devia ocupar lugar cimeiro nas negociações efectuadas por Andrade Corvo com o governo francês (23). Os já tradicionais argumentos utilizados por Portugal de prioridade de descobrimento e de ocupação anterior e em permanência eram contestados pela França, dado que também esta considerava exercer sobre o rio Casamansa direitos efectivos de soberania de posse e de comércio (24), adquiridos por tratados com régulos ou através da conquista.

Portugal transigiu face aos limites na Costa Ocidental, mas obteve em troca o reconhecimento de “(...) exercer a sua influência soberana e civilizadora nos territórios que separam as possessões portuguesas de Angola e Moçambique, sob reserva dos direitos anteriormente adquiridos por outras potências (...)”, e de que a França se obrigava, note-se, “(...) pela sua parte, a abster-se ali de qualquer ocupação (...)”(25).

Com a Alemanha, as negociações começaram por definir as fronteiras Sul de Angola e, a partir da instalação de Berlim em Zanzibar, abarcaram também a fronteira Norte de Moçambique, conduzindo à Convenção Luso-Alemã de 30 de Dezembro de 1886.

Em anexo à Convenção, vinha publicado um mapa da esfera de influência portuguesa, numa vasta faixa entre Angola e Moçambique - o Mapa Cor-de-Rosa (26)-, sonho que remontava ao séc. XVI, aquando do domínio filipino, com a intenção de ligar Angola ao Reino do Monomotapa. A esfera de influência do Mapa Cor-de-Rosa compreendia territórios (Terras dos Matabeles, da Machona e do Barotze e grande parte da região do Niassa) que impossibilitavam à Grã-Bretanha a ligação ferroviária do Cabo ao Cairo e a sequente hegemonia no domínio de toda a África.

A Alemanha tinha a perfeita noção de que o texto afectava os interesses ingleses na região. Assim, apoiou as pretensões portuguesas, mas reduziu o seu impacto com a transformação do Tratado numa mera Declaração. O documento foi posteriormente assinado.

A reacção inglesa é imediata. Na procura de conduzir os Ingleses a negociações, faltou a Portugal a prudência de não negociar simultaneamente com eles a composição do interesse dos dois países, evitando talvez com isso o malograr das suas intenções.

A consolidação da soberania portuguesa era tentada pela ocupação efectiva e pelo reconhecimento dos régulos. Portugal parecia decidido a ganhar a competição de Cecil Rhodes. Apoiou-se no reconhecimento francês e alemão e enviou vários exploradores.

Portugal ambicionava que a Inglaterra, tal como a Alemanha e a França, lhe reconhecesse o direito de soberania nos territórios compreendidos entre Angola e Moçambique e ainda sobre o Lago Niassa, pois já “(...) desde os começos do século XIX os portugueses cruzavam, ousadamente, o adusto sertão de entre as terras de Moçambique e Angola, domínios seculares da monarquia, com o objectivo de fazerem desse imenso território um novo Brasil (...)”(27). Porém, todas estas expedições eram ignoradas do grande público.

Barros Gomes gizara em 1888 um plano que incluía seis expedições em Moçambique. As zonas de Manica e o Sul do Zumbo foram cobertas em fins de 1888, princípios de 1889, por duas expedições de Paiva d´Andrada e uma de Victor Cordon. Com estas expedições Portugal considera que fica sob seu controlo teórico toda a zona Mashona. As outras três expedições visavam assegurar o controlo do Sul do Lago Niassa (28).

A Grã-Bretanha considerava os territórios a Norte da República da África do Sul e do Protectorado da Bechuanalândia, a Sul do rio Zambeze, a Este de 20º Este e a Oeste da Província portuguesa de Sofala, como estando exclusivamente dentro da sua esfera de influência, disso informando, cautelarmente, o Presidente Kruger, a 25 de Julho de 1888. Em Outubro desse ano, Lord Salisbury ainda pensou em negociar com Portugal o limite de Sofala e, na Primavera de 1899, reagiu negativamente ao ter conhecimento das expedições de Paiva d´Andrada para consolidar o domínio português, nomeadamente no Zumbo (29).

Por carta régia de 25 de Outubro de 1889, a Raínha Vitória concedeu personalidade jurídica e direitos majestáticos à British South Africa Company ou Chartered (B. S. A. C.); esta tinha poder para ocupar e colonizar territórios para a soberania inglesa. À frente da Chartered, Cecil Rhodes desenvolvia a sua influência junto de Matabeles e Machonas e introduzia emissários seus no Chire e no Niassa. Por decreto de 9 de Novembro, o Governo Português responde com a criação do Distrito do Zumbo, nele incluindo territórios em disputa a montante do Zambeze, procurando assim criar uma zona tampão.

Com a construção do caminho de ferro de Lourenço Marques ao Transval (30), iniciada em 1887, o Sul do território do actual Moçambique adquire importância geopolítica. A expropriação do caminho de ferro, em Junho de 1889, é explorada na imprensa em Londres por Cecil Rhodes. Os ingleses reclamam uma indemnização, mas a sua moderada posição deve-se sobretudo ao facto de a manutenção da linha por Portugal ser mais segura do que se aquela estivesse nas mãos de privados ingleses, pois poderia ser vendida a capitais alemães, holandeses ou boers (31).

A actuação armada do 1º Tenente João de Azevedo Coutinho, no vale do Chire a 8 de Novembro de 1889, é tida como um casus beli pela Grã-Bretanha, que, consciente do real isolamento português, deixa claro que não aceita qualquer tipo de negociação e efectua uma concentração de meios navais em pontos estratégicos. A 11 de Janeiro de 1890 formula um Ultimatum (32) a Portugal, exigindo o envio ao Governador de Moçambique de instruções telegráficas imediatas para que todas as forças actuantes, quer na região do Chire (Malawi), quer nos territórios que hoje integram a Zâmbia e o Zimbabwe (terras dos Macololos e Machonas), se retirassem. Sem estas instruções as seguranças dadas pelo Governo de Lisboa eram ilusórias.

Portugal responde de imediato ao Ultimatum com a procura de apoio junto de outras potências europeias para conseguir um processo de arbitragem, ao abrigo do Artº. 12º do Acto Final de Berlim.

O Ultimatum inglês provoca um sentimento de indignação e revolta e, ao mesmo tempo, vem “(...) inspirar a exacerbação do nacionalismo ferido dos portugueses (...)” (33), levando a um agravar do descrédito do liberalismo monárquico e a uma consequente adesão ao Partido Republicano. O Rei reage, conferindo esforço à presença efectiva em terras de África.

A forte reacção anti-britânica por parte do povo português mais estimulou o esforço de defesa. Em Lourenço Marques apareceram cidadãos voluntários para restabelecer a soberania portuguesa em Manica.

Porém, por insuficiente penetração no hinterland africano e “(...) por não ter sabido retirar a tempo, devido à leveza de critério dos governantes (...)”(34), Portugal acabaria por ceder, sem capacidade de resposta, ao Ultimatum de 1890. Assim, foi forçado a aceitar a argumentação de que nos territórios coloniais apenas a ocupação efectiva servia de título a direitos de soberania.

Os Tratados de partilha do território pelas potências coloniais europeias, assinados posteriormente a Berlim, foram negócio exclusivo destas. A divisão e consequente definição de fronteiras foi arbitrária, de concepção europeia, sem significado para os africanos e com consequências (positivas e negativas) inesquecíveis, nomeadamente para as populações indígenas (35), delimitando as potências europeias as suas esferas de influência.

A partilha de África foi conduzida em larga medida por diplomatas ansiosos por resolver a disputa africana antes que “(...) ela podesse perturbar o interesse vital dos Estados no resto do mundo (...)”(36), tendo resultado na partilha irrealista que conhecemos. A Portugal, segundo Gonçalves Martins, couberam apenas os “(...) territórios e os direitos permitidos pela ambição e o equilíbrio existente nos poderes políticos europeus (...)”(37).

A noção de esfera de influência introduzida no Tratado Germano-Britânico de 1 de Julho de 1890 (38), encontrava-se em contradição com a Acta Final de Berlim, sem contudo a violar. Esta apenas se referia às Costas do Continente e preconizava o “exercício de uma autoridade suficiente”, impedindo, assim, a partilha sobre a Carta Africana, sem ocupação concreta e efectiva, por aplicar às regiões interiores princípios opostos. As esferas não podiam ser delimitadas com rigor, pois os tratados que as repartiam encontravam-se submetidos a eventuais revisões de pormenor (39). As esferas de influência apenas eram estabelecidas com segurança, quando definidas por tratado reconhecido pelos diversos Estados interessados.

Pelo Tratado Germano-Britânico, assinado pelo governo do General Von Caprivi, a Inglaterra cede a ilha de Heligolândia, com algum valor estratégico, para salvaguarda das Costas alemãs de eventuais ataques navais, e definem-se as esferas de influência, bem como as fronteiras comuns, quer em África quer no Pacífico. No Tratado, a Alemanha recebeu a ligação do sudoeste africano alemão ao Zambeze, com a chamada faixa de Caprivi.

De acordo com Marcello Caetano, “(...) por mais antigas e estreitas que sejam as alianças, não há pacto de amizade que leve as nações poderosas a sacrificar os seus interesses ou a moderar as suas cobiças perante uma Nação pequena se esta não for a primeira a ter a consciência, a inteligência e o zelo daquilo que lhes respeita (...)”(40); no caso particular da aliança entre Portugal e Inglaterra, a hegemonia inglesa em colónias fez daquela a primeira adversária de Portugal no Ultramar. Assim, e de acordo com Franco Nogueira, o Direito Internacional Público, por vezes, parece ser “(...) uma bela disciplina para deleite académico, fornecedora de fórmulas decorativas para convenções e tratados, que nenhum governo acata, doutrinadora de teorias que nenhum governo subscreve (...)”(41).

Portugal atravessava grave crise financeira e necessitava de acelerar o desenvolvimento dos territórios africanos, mas, devido à escassez de fundos, encetou a 16 de Maio de 1896 negociações com Londres para a obtenção de um empréstimo, fornecendo em troca a garantia sobre as alfândegas coloniais. A Alemanha interveio, pois pretendia o empréstimo em comum e não que nenhuma das potências o fizesse em separado. Assim, propôs à Inglaterra, um empréstimo comum a Portugal, garantido pelos rendimentos das alfândegas coloniais, atribuídos a um e a outro país de acordo com uma divisão em esferas de influência. No caso hipotético de Portugal não pagar ou se houvessem distúrbios graves que levassem à queda do Império, cada país assumiria as respectivas responsabilidades dentro da sua esfera de influência. À Inglaterra não convinha ter a Alemanha como adversária, o que conduziu ao início das conversações em fins de Junho de 1898. Era urgente garantir a neutralidade alemã, dado que a Alemanha só deixaria de apoiar os Boers se o ministro Balfour assinasse o acordo para a redivisão da África Austral em esferas de influência.

A 30 de Agosto de 1898, procedeu-se à assinatura entre Ingleses e Alemães de três documentos (42):

Uma convenção sobre o possível pedido de empréstimo feito por Portugal;

Uma convenção secreta (43) para a hipótese de Portugal não poder manter as suas colónias africanas ao Sul do Equador e a ilha de Timor;

Uma nota secreta sobre concessões nas esferas de influência.

As convenções assinadas a 30 de Agosto de 1898 forçam os dois países a um compromisso de empréstimo, apenas comum, dividindo os rendimentos das alfândegas de Angola, Moçambique e Timor. As convenções secretas não forneciam nada de novo aos ingleses, uma vez que estes já detinham o direito à preferência de todo o território a Sul do Zambeze, conferido pelo acordo com Portugal assinado em 1891. O Governo Britânico não pretendia a divisão do Império Português. Tal como em 1961/1974, o que estava em jogo excedia esse Império. Para a Inglaterra, urgia que os alemães não apoiassem os Boers e o Transval. Conseguido o isolamento boer, a Inglaterra tinha aberto o caminho que possibilitou a guerra com o Transval, sem provocar um conflito europeu.

Portugal obteve auxílio financeiro junto da França, o que lhe permitiu recusar o “presente envenenado” dos ditos aliados. Consideramos importante referir que, quando Portugal tentou negociar um empréstimo com a França e surgiu a hipótese de o garantir com o rendimento da Alfândega dos Açores, os EUA revelaram, pela primeira vez, interesse por aquele arquipélago, ao que os ingleses se opuseram.

Os Acordos secretos de 1898 conhecidos como o Tratado de Westminster, foram mais do que “(...) um simples exercício no papel para excluir os Alemães da África do Sul. Tinha o efeito de dividir as colónias portuguesas em esferas de influência com o propósito de actividades comerciais, investimentos e até actividade missionária, removendo assim a constante fonte de atrito causada pela suspeição mútua das grandes potências (...)”(43).

Apesar das posições adoptadas por Inglaterra, que punham em causa a aliança secular, Portugal comprometeu-se a não deixar passar armamento e munições destinados ao Transval e a não declarar neutralidade em caso de guerra entre este último e a Inglaterra, e esta garantiria a segurança das possessões coloniais portuguesas. É esta a base da declaração secreta Luso-Britânica de 14 de Outubro de 1899 - indevidamente conhecida pelo Tratado de Windsor - obtida pelas conversações entre o Marquês de Soveral, ministro de Portugal em Londres, com Lord Salisbury e que veio reforçar os tratados de aliança de 1642 e 1661.

A Inglaterra, desde 1879, tinha por objectivo decisivo a anexação das riquezas das Repúblicas do Transval e de Orange. Sempre foi importante para esta possuir o controlo directo/indirecto sobre a Baía de Lourenço Marques, disputando esse acesso com o Transval. Os interesses de domínio sobre os portos da Beira e de Lourenço Marques eram sobretudo pelo controlo conferido ao tráfego comercial e à possibilidade de, em caso de guerra, aí desembarcar forças. Veja-se o tratado com Portugal de 1879 e o forçar da assinatura de acordos que garantiam a proibição da importação de armamento e o direito de trânsito de tropas inglesas. Nesta ordem de ideias, o grande objectivo inglês na década de 90 do século XIX era impedir o apoio da Alemanha ao Transval e assegurar um isolamento diplomático dos Boers.

A guerra anglo-boer que “forçou” a assinatura das convenções Anglo-Alemãs para a divisão do Império Ultramarino Português conduziu à reafirmação da velha aliança, ficando a Convenção com a Alemanha sem aplicação de momento. Note-se a habilidade da diplomacia inglesa que conseguiu conciliar as suas afirmações de lealdade à aliança com as combinações com a Alemanha. O conhecimento da postura a que Portugal fora submetido desencadeou internamente uma onda de críticas e graves acusações ao Governo e à Monarquia.

Apesar de reafirmada a “velha aliança”, como já vimos, se os interesses vitais da Inglaterra estivessem em jogo, esta não hesitaria em usar Angola e Moçambique como moeda de troca, desde que o resultado final salvaguardasse para si os dois corredores estratégicos de acesso ao Índico.

A Inglaterra em 1912 vai pôr em causa novamente a secular aliança. Numa época conhecida como “período da Paz Armada”, inicia uma revisão oficial do acordo secreto de 1898 com a Alemanha, procurando agravar a situação financeira de Portugal e provocando um empréstimo mútuo, com a garantia das alfândegas coloniais. Nesta altura, Portugal encontrava-se fragilizado pela conjuntura pós-revolucionária. Afonso XIII de Espanha revelava também intenções de entrar em Portugal, pois não lhe convinha a vizinhança de uma República anárquica. Não deixa de ser curioso que esta intervenção viesse a ser evitada pela Inglaterra (44).

As promessas e facilidades oferecidas pela Inglaterra procuravam desencorajar os Alemães de prosseguirem o seu programa naval - que estes destinavam à participação na partilha da Ásia - desenvolvido na última década do séc. XIX, e que só poderia ser interpretado como um desafio directo a Inglaterra.

No preâmbulo da Convenção, segundo a versão alemã, última a ser apresentada e aprovada, justificam as partes contratantes os motivos do acordo e que seriam: obviar as complicações internacionais de uma possível crise financeira em Portugal, nomeadamente mantendo a sua integridade e independência e preservando os interesses das colónias alemãs e inglesas contíguas às portuguesas. No que diz respeito ao território de Moçambique, era estipulado no Artigo 2º que o empréstimo inglês teria por garantia as receitas alfandegárias de Moçambique ao Sul da embocadura do rio Lukugu, acompanhando o seu curso até ao desembocar do rio Lugera, deste último até à sua origem, seguindo depois até ao paralelo 16 o Sul e, por fim, deste paralelo até à fronteira do Protectorado do Niassa (45). No fundo, uma repetição da atitude de 1898, mas com novas bases de partilha.

A revisão decorreu ao longo de todo o ano de 1913, nunca tendo sido definida uma data para a sua publicação, em virtude da existência de inúmeras negociações sobre uma diversidade e multiplicidade de áreas de interesse. Outros factos vieram provocar o adiamento da publicação, concretamente o conhecimento pela França das negociações.

Seguiu-se a guerra, o que impediu a conclusão do acordo. Por conseguinte, a convençãosecreta de 1913 constitui um nítido exemplo de como as tensões entre as grandes potências podem ser aliviadas, funcionando as colónias africanas portuguesas como moeda de troca entre aquelas que definiam o precário equilíbrio europeu; por outro lado, esta convenção “(...) vem reforçar o argumento contrário à opinião de que a rivalidade imperial contribuiu para criar as condições propícias ao eclodir da Primeira Guerra Mundial (...)”(46).

Parece-nos importante salientar que as referências históricas a que nos reportamos só foram conhecidas após a I Guerra Mundial, altura em que foram publicados os documentos oficiais sobre a actividade diplomática deste período, e que os diplomatas e governantes portugueses das gerações de 1898 a 1914 sabiam apenas o que fora transmitido por Sir Arthur Balfour ao marquês de Soveral em 1898, pelo embaixador britânico em Lisboa, Sir Arthur Hardinge, ao Primeiro-Ministro e Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Augusto de Vasconcelos, em 1912, e por Sir Eye Crow, então alto funcionário do Foreign Office, ao Dr. Teixeira Gomes, em 1913 (47). Daqui se conclui que as Informações externas portuguesas ao nível formal não existiam; apenas funcionavam informalmente, através das intervenções de D. Manuel II em Londres, e no que diz respeito a Inglaterra. O Rei actuava como “Embaixador incógnito” do Governo Português (48); e fá-lo-ia até à sua morte (1932).

 
 

 




 



hospedagem
Cyberdesigner:
Magno Urbano