FRANCISCO PROENÇA DE GARCIA
Os movimentos independentistas,
o Islão e o Poder Português (Guiné 1963-1974)

CAPÍTULO I - Os grandes poderes mundiais e a África Negra subsequente à Conferência de Berlim
2. - A guerra de 1914-1918 e o Pacto da Sociedade das Nações

Para Marcello Caetano, o período entre 1884 e 1891 foi de definição de princípios, seguido de um período, entre 1891-1914, em que as potências procuravam consolidar e arredondar as ocupações territoriais em África (1).

Na génese do primeiro conflito mundial encontram-se, entre outros motivos: o acentuar da rivalidade, no pós guerra franco-prussiana, entre a potência continental - a Alemanha - com uma forte impulsão industrial (2), e a potência marítima - a Inglaterra - com uma componente comercial elevadíssima; o constante desafio à supremacia inglesa nos transportes, onde se pode incluir o projecto de ligação ferroviária Berlim-Bósforo-Bagdad (3); uma rivalidade comercial, quanto à área da Sérvia, Roménia, Grécia e Bulgária, por parte da Rússia e dos Impérios Centrais; nos Balcãs, a rivalidade entre o Pan-Germanismo e o Pan-Eslavismo; a necessidade do Governo Russo recuperar, face ao desprestigiante desaire militar com o Japão e, aproveitando um possível frentismo interno em relação ao conflito externo, tentar ultrapassar a crescente agitação revolucionária.

Uma vez que o nosso estudo visa um problema africano, interessa reter a ideia de Marcello Caetano, segundo a qual esta guerra “(...) foi em grande parte originada por causas ligadas à expansão colonial (...)”(4) e, rapidamente, se estendeu às possessões alemãs em África. Quanto às parcelas do território português no continente africano, desde 1913 que os Governadores, esclarecidos e informados com regularidade, previam ameaças alemãs e o abandono a que seriam votados pelos seus aliados, em caso de ataque, preparando-se, de acordo com as possibilidades locais, para não deixarem ocupar qualquer parcela do território (5).

Ultrapassado o conflito pela vitória aliada sobre os Impérios Centrais e a Turquia, o armistício com a Alemanha é assinado a 28 de Junho de 1918, na Paz de Versalhes. O instrumento constitutivo da Sociedade das Nações foi incluído em todos os tratados de paz (6).

A entrada dos Estados Unidos da América na guerra, a 2 de Abril de 1917, quebra a política de abstenção face às disputas europeias da Doutrina de Monroe. Numa mensagem ao Congresso, em 8 de Janeiro de 1918, Woodrow Wilson formulou os princípios de base da futura paz - Os catorze pontos de Wilson - (7), marcando o início da futura e longa ingerência dos EUA na vida internacional, que perdura ainda na nossa década.

 

(1) Marcello Caetano, “Portugal e a Internacionalização dos Problemas Africanos - História duma Batalha: da Liberdade dos Mares às Nações Unidas”, pág. 163.

(2) Na Alemanha acentuava-se o desenvolvimento industrial, atingindo esta em 1914 uma produção de ferro que ultrapassava a da França e da Inglaterra juntas.

(3) Esta construção iria afectar, no caso inglês, a projectada política para o Próximo e Médio Oriente, e a segurança na Índia. No que diz respeito à Rússia, iria prejudicar o almejado controlo do espaço Otomano.

(4) Marcello Caetano, “Portugal e a Internacionalização dos Problemas Africanos - História duma Batalha: da Liberdade dos Mares às Nações Unidas”, pág. 193.

(5) O Decreto que mandou organizar as primeiras expedições militares a Moçambique e Angola é de 18 de Agosto de 1914, e o ataque a Mazíua, na fronteira do Rovuma, verifica-se na noite de 24 para 25 de Agosto do mesmo ano.

(6) Os Tratados de paz, assinados no termo da guerra 1914/18, incluíam todos o Pacto da SDN: Tratado de Versalhes com a Alemanha (28 de Junho de 1919); Tratado de Saint-Germain-em-Laye com a Áustria (10 de Setembro de 1919), Tratado de Neuilly com a Bulgária (27 de Novembro de 1919), Tratado de Trianon com a Hungria (4 de Junho de 1920); Tratado de Lausanne com a Turquia (24 de Junho de 1923). Este último substituiu o Tratado de Sèvres, assinado em 10 de Agosto de 1920, não ratificado pela Turquia. O Tratado de Versalhes também foi ratificado pelos EUA, em 25 de Agosto de 1921, tendo a paz sido assinada em separado com a Alemanha. Os EUA nunca fizeram parte da SDN, refluindo aqui ao isolacionismo político, definido pelo congresso.

(7) O quinto ponto preconizava “conciliação livre, num espírito amplo e absolutamente imparcial, de todas as reivindicações coloniais, baseada no respeito estrito do princípio que, regulando todas as questões de soberania, as conveniências das populações interessadas deverão pesar com peso igual com as demandas equitativas do Governo cujo título estará por definir-se”. Celso Albuquerque, “Os 14 Pontos de Wilson”, em “Legado Político do Ocidente : O Homem e o Estado”, pág. 212, Instituto Português da Conjuntura Estratégica, Lisboa, 1995.

 
 

 




 



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