MÁRIO MONTAUT
Pira d'água

Rosa

Rigor do moinho

Pira d’água

Sentimento

De 1 objeto que ela fez pra nossa casa

Rosa

Por que me trair numa oração?
Trair Deus numa oração...
Se Deus se revela numa folha,
numa onda,
numa flor,
como não se revelaria numa mulher, Rosa?
Em certas noites desesperadas alguma reza me socorre.
Nesta noite,
porém,
Deus é você meu bem.
Nenhum terço,
ou mantra.
Apenas seu nome saindo repetidamente de meus lábios
rezando Rosa pelos meus infernos, purgatórios e paraísos;
todos eles conformados à geometria íntima de suas mãos,
sua pele,
sua boca,
seu sexo,
seus olhos
seus olhos
seus olhos
seus olhos
que me olham e bendizem
a singela,
a sagrada coragem de assim rezá-la.
Não para aplacar minha dor,
mas para não pecar contra o Espírito Santo,
presente na derradeira imagem:
quando jorro em seu rosto,
e quando esta seiva lhe adentra e lhe escorre...
até pelos olhos
olhos
olhos
olhos nem meus nem seus;
talvez olhos de Deus vejam as pombas e águias,
harpias,
uirapurus;
e toda essa constelação de aves lindas, atrozes,
santifica o Espírito,
e glorifica a intenção desta reza
que não terminará jamais;
da qual lhe canto apenas isso.
Afinal,
você não quis saber toda a verdade, amor?
Toda é inviável,
talvez inexista;
mas deste pouquinho do real,
não haveria de poupá-la.
Com fé e esperança em noites melhores dormidas.
Te amo.
Aceite isso.
Deus não me culpa,
porque lê o poema,
e vê que ele é péssimo,
e que estas linhas nem chegam a versos;
apenas distribuem-se ao ritmo da mais autêntica paixão.

MÁRIO MONTAUT é brasileiro, paulistano, de ascendência italiana, espanhola, indígena, moura, francesa e outras. Desenvolve uma sequência de composições que vêm à luz, já em dois trabalhos: "Bela Humana Raça", Dabliú, 1999, e "Mário Montaut: Samba De Alvrakélia", a sair nos próximos dias pelo selo MBBmusic. São muitos anos de vivências artísticas, num panorama que inclui Dorival Caymmi, René Magritte, Manoel De Barros, João Cabral De Melo Neto, Borges, Chico, Caetano, Gil, Dalí, Fellini, Buñuel, Webern, Cartola, Breton, Blavatsky e muitos amores mais, indispensáveis à sua criação, que abarca, além das canções, poemas, textos, roteiros e outras coisas interessantes. Mário Montaut é basicamente um parceiro de todos os seus contemporâneos e ascendentes, humanos ou não, saibam eles ou não. Índios, Negros, Europeus, Sem-terra, Brisas, Baleias, Maremotos, Chuvas, Livros, Discos, Beijos e Trovões Em Todas As Roseiras. Atualmente grava um disco de parcerias suas com o poeta Floriano Martins, onde a talentosíssima intérprete Ana Lee canta grande parte do repertório. Mário Montaut é um pouco de tudo isso. E muito mais, com certeza, pode ser descoberto em seus discos lançados, em suas tantas canções já gravadas, poemas, textos, e múltiplos achados.