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REVISTA
TRIPLOV
de Artes, Religiões e Ciências
ISSN 2182-147X
NOVA SÉRIE |
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Adelto Gonçalves |
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A influência árabe na literatura brasileira
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A
Literatura Brasileira e a Cultura Árabe,
de Moema de Castro e
Silva Olival. Goiânia: Editora Kelps, 236 págs., 2015. E-mail:
moemacsolival@hotmail.com
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I |
Quando os portugueses chegaram a
Moçambique, ao final do século XV, algumas cidades já floresciam na
chamada contracosta africana, onde os bantos negociavam com outras partes
da África, do Oriente Médio e da Índia. A influência árabe nestes portos
era forte e o suaili era a língua franca do comércio.
Foi da fusão das comunidades bantas
e dos árabes que nasceu a cultura suaili de que faz parte o litoral do
Norte de Moçambique, do Quênia e da Tanzânia. Mas, até hoje, por razões
várias, que incluem motivações geopolíticas, pouco tem sido estudada essa
influência na Literatura Moçambicana em Língua Portuguesa.
No Brasil, essa influência também
tem sido vista com pouca (ou nenhuma) atenção, ainda que a presença árabe
por aqui seja mais recente. Para corrigir (ou amenizar) essa falha, a
professora Moema de Castro e Silva Olival acaba de publicar
A Literatura Brasileira e a Cultura
Árabe (Goiânia, Editora Kelps, 2015), que reúne ensaios sobre seis
escritores brasileiros de origem libanesa, destacando a significativa
contribuição dos imigrantes árabes para a formação cultural do País. É de
se lembrar que hoje são mais de seis milhões os libaneses e seus
descendentes radicados no Brasil, uma população igual à do Líbano. E que,
nos dias de hoje, já são 8.530 os refugiados sírios, que imigraram
recentemente em função da crise político-econômica que vive a Síria.
Na introdução, a professora Moema
Olival explica que não foi seu objetivo fazer um estudo específico da
cultura árabe nem reunir autores quanto à temática comum, mas sim
observar, como no decorrer de suas obras, esses escritores acabam
apontando para traços que os reúnem como intelectuais modernos, de
procedência comum: a libanesa. Ou seja, a ensaísta procura mostrar como a
narrativa ficcional desses autores se entretece com dados relativos ao
povo e costumes árabes, uns mais ambientados, modernizados; outros menos,
mas sempre a revelar a origem: “um povo que é parte do leque de etnias que
constituem e enriquecem o diversificado universo sociocultural
brasileiro”.
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II |
O romance
Lavoura Arcaica (1976), de Raduan Nassar (1935), é definido por Moema
Olival como “uma semeadura narrativa que viceja, com austeridade e
determinação, sobre um arcabouço familiar libanês, construído sob
rigorosos laços de afeto e amor, em terras brasileiras”. Para ela, o
romance espelha com fidelidade a cultura do patriarcalismo comum ao mundo
árabe. Já ao analisar Um copo de cólera (1978), também de Raduan Nassar, a ensaísta
destaca a problemática sexual que a novela traz, lembrando que o tema tem
sido frequentemente abordado pela literatura árabe.
De Salim Miguel (1924), nascido no
Líbano, Moema Olival estuda o romance
Nur, na escuridão (1999),
narrativa autobiográfica que reconstitui a trajetória da família do autor,
desde o desembarque de Yussef, seu patriarca, em 1927, no cais da Praça
Mauá, no Rio de Janeiro, e “a luta assumida por aquela família na sua
aventura de tentar novos destinos”, passando por seu esforço por encontrar
um bom comércio em Biguaçu e Florianópolis, em Santa Catarina, e no Rio de
Janeiro, para oferecer uma vida melhor à família que, com o passar dos
anos, reuniria sete filhos. De Salim Miguel, a ensaísta analisa ainda
Eu e as corruíras (2001), livro
comemorativo dos 50 anos de estréia do autor, que reúne crônicas e
depoimentos.
De Milton Hatoum (1952), com
certeza o autor de descendência libanesa mais proeminente hoje na
literatura brasileira, com quatro romances premiados e traduzidos em dez
línguas e publicados em 14 países, Moema Olival analisa os romances
Dois Irmãos (2000) e
Cinzas ao Norte (2010). Se o
primeiro romance retrata o drama de mais uma família libanesa estabelecida
no Brasil e a saga de dois irmãos gêmeos (Yakub e Omar), na cidade de
Manaus, às margens do Rio Negro, o segundo busca trilhar um caminho aberto
por Machado de Assis (1839-1908), em
Dom Casmurro (1899), ao deixar para o leitor a tarefa de concluir se
Ran ou Arana seria o pai de Mundo (Raimundo), uma das personagens
principais.
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III |
De Carlos Nejar (1939), a ensaísta
debruça-se sobre Carta aos loucos
(1998), terceira obra em prosa do poeta gaúcho e membro da Academia
Brasileira de Letras desde 2009, e
Riopampa: o moinho das tribulações (2004), romance que igualmente
reconstitui os percalços de uma família que habitava um moinho. Para a
professora, “Riopampa é uma
parábola da vida e da morte, e do desamor, do egoísmo e da generosidade,
da guerra e da paz, das classes político-sociais que separam os homens,
das forças da natureza sobre os sentimentos, e da alma que as traduz”.
De Miguel Jorge (1933), nascido em
Campo Grande-MS, mas estabelecido em Goiás desde cedo (em Inhumas e,
depois, em Goiânia), membro da Academia Goiana de Letras, a ensaísta
estuda Veias e Vinhos (1982), Nos
ombros do cão (1991) e Pão
cozido debaixo de brasa (1997), trilogia urbana centrada em Goiânia,
O Deus da hora e da noite (2008)
e Minha querida Beirute (2012),
sua última obra publicada.
Por fim, de William Agel de Mello
(1937), a ensaísta discute o volume I de suas
Obras Completas (2008), que
reúne sua ficção (os demais volumes abrangem tradução, ensaios,
monografias e artigos, fortuna crítica e dicionários). Sua ficção é
composta por dois romances (Epopéia
dos sertões e O último dia do
homem) e dois livros de contos (Geórgicas
– Estórias da terra e
Metamorfose). De Geórgicas,
analisa especificamente o conto “Baalbek”, que, segundo ela, sintetiza com
dramaticidade os perfis da raça árabe: “o espírito aventureiro, amor ao
comércio e à cultura, aos amigos, a consciência de seus direitos, a
complacência com os mais fracos, o espírito religioso, endossando as
convicções herdadas”.
Provavelmente, porque estes dois
últimos autores estão diretamente ligados ao solo goiano, Moema Olival
dedica maior espaço ao estudo de suas obras, chegando a ponto de esmiuçar
capítulo por capítulo Minha querida
Beirute, de Miguel Jorge, obra que, em sua opinião, representa uma
súmula dos preceitos morais, éticos e afetivos característicos de uma
família libanesa tradicional. Ou seja: “para o homem, tudo. Para as
mulheres, a restrição e a obediência”, constata.
De fato, como observa o professor
Fabio Lucas no prefácio que escreveu para este livro, a professora goiana,
com estes ensaios, aponta não só uma nova perspectiva para o estudo da
cultura libanesa projetada no ambiente brasileiro como abre o debate sobre
a contribuição dos escritores descendentes de árabes à ficção produzida no
Brasil, repetindo-se aqui o que diz o próprio Miguel Jorge na contracapa
deste livro.
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IV |
Ensaísta, crítica literária,
professora emérita (aposentada) da Universidade Federal de Goiás (UFG),
Moema de Castro e Silva Olival é doutora em Letras Clássicas e Vernáculas
pela Universidade de São Paulo (USP). Fundadora e primeira coordenadora do
Centro de Estudos Portugueses da UFG e do mestrado em Letras por oito
anos, é sócia-correspondente da Academia Brasileira de Filologia
(Abrafil), do Rio de Janeiro, e da União Brasileira de Letras (UBE)-RJ.
Membro da Academia Goiana de Letras (AGL) e da seção de Goiás da UBE, é
membro-titular do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG).
Tem 14 livros de ensaios
publicados, entre os quais se destacam:
O processo sintagmático na obra
literária (Editora Oriente,1976),
O espaço da crítica – panorama atual
(Editora UFG, 1998), GEN – um
sopro de renovação em Goiás, v. I (Editora Kelps, 2000),
Moura Lima: a voz pontual da alma
tocantinense (Editora Cometa, 2003),
Diálogos plurais (R&F
Editora, 2008), O espaço da crítica
III (Editora da UFG, 2009), Um sopro de renovação em Goiás, v. II (Editora Kelps, 2009),
Novos ensaios – vozes em interação
(Editora Kelps, 2010), e Contos
(Des)armados (Editora Kelps, 2014).
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Adelto
Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela
Universidade de São Paulo (USP) e autor de Os Vira-latas da Madrugada
(Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981), Gonzaga, um
Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),
Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo,
Publisher Brasil, 2002), Bocage - o Perfil Perdido (Lisboa,
Caminho, 2003) e Tomás Antônio Gonzaga (Rio de Janeiro, Academia
Brasileira de Letras; São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2012), entre outros. E-mail: marilizadelto@uol.com.br |
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