OUTRAS JANELAS
Dheyne de Souza & Floriano Martins

PÉTALA

 

a noite um olhar descoberto

como uma pétala

no escuro.

 

MÓBIL

 

Pregueada no tempo

desenvolta em cenários

deslizando nos móveis

quando correm os olhos

parados

 

a tua imagem caída

camuflada silêncio

nas horas

estancadas memória

movediça.

 

OUTRA FATIA

 

ouço tua voz

no intervalo das sílabas mais mudas

do rastro

da tua língua

 

UM AMONTOADO, DE TELHA

 

o teu rastro me assinala

como um amontoado de telha

com sombras, musgos, raios

quedas folhas cócegas

cantam por baixo dos pés.

 

BECOS DE PELE

 

Pisou a espinha como um corpo mormaço

Fundou folhas secas como esquinas

E partiu

como passos nas costas.

A CIDADE, O SER

 

a cidade está curvada

como uma taça seca

esquecida

e vulnerável

como uma mão

bebida.

 

A NOITE

 

a noite termina

com lâmpadas acesas

como uma ausência

à porta.

 

NA VOZ DAS JANELAS

 

Eu posso te tocar o lábio, te soprar o olho, te rimar a face

Eu posso te sonar a espera, te afinar a busca, te entornar a ordem

Eu posso escandir teu som, libertar teu verso, rasurar tua língua

Eu posso entupir de letra toda a partitura de teu gozo cru

Eu só não posso esperar as portas ritmarem ilesas os verbos das tuas mãos

enquanto

o vento morre gasto nas outras janelas.

 

BREU

 

Algo com que turvo

Com que força

Escuro e léu

Rasga com que pinça

Com que broto

Piche desintegra

Uma flor negra

Com que rega

Sepulcros no céu

AGORA,

 

há tantos postes tateando a ausência

como pelos na superfície dos gestos

poemas: dheyne de souza

Imagens: floriano martins

Floriano Martins (Brasil, 1957) é editor da Agulha – Revista de Cultura (www.revista.agulha.nom.br), e curador da Bienal Internacional do Livro do Ceará.
 

 

 




 




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