u) Pode o ouro ser subtraído em átomos ao mercúrio?



+ 1. Se as asas lhe tiro, fica mais pesado. Se as asas lhe corto, recupera.

Meu amor deixa de ser deficiente, coitadinho!

 

+ 2. Dentro de vinte mil milhões de anos mudarei de casa. Outra Gea me acolherá. Estudarei por outros livros a Geografia. A Matemática será do mesmo modo diferente.

Outras serão as leis da vida evocadas em mim. Quando eu mudar, nunca os brancos sorrisos terão criado noute de maior luar! Com um sino de prata, tangendo ao luar! Um cinto de nata cintará o luar!

Beijarei enfim a minha flor extática. Esse rapazinho louro! Seu d ' ouro vestido. Seu d' ouro rio...

Esse rapazinho estratosférico e pernalta!

Essa máquina de fazer gal-gal.

 

+ 3. Dentro de vinte mil milhões de anos o Sol explodirá.

Sinto profundamente.

Estou beramente sentido.


+ 4. Dentro de vinte mil milhões de anos o big ben soará.

 

+5. Então e a minha eternidade ?

Então e a minha obra poética futura?

 

+ 5. O cão sua vulcanicamente. A abóbada celeste racha em duas ametades.

A Lua se fará sangue. Sete partes dos mares profundos defraudarão as águas. A terça parte dos rios cobrir-se-á de neve carbónica.

Daqui a vinte mil milhões de anos.

Nessa altura, estarei noutro planeta a observar.  À hora da ceia passará o filme na TV. Hei-de vê-Io distraidamente. A TV banaliza a morte, banaliza tudo. Verei o fim do mundo distraidamente.

Dentro de vinte mil milhões de anos estarei num remotíssimo planeta a assistir ao Apocalipse em emissão directa trans-solar.

+7. Almas em transumância

 

+ 8. E a tua boca que é uma eternidade além da minha!

A tua eternidade que morro por beijar!

Tu, que estás tão perto e és doce e acessível à minha concepção das cousas práticas! Tu, que tens na boca o Sempiterno! Tu, que és o grande mar!

Digo o teu nome baixinho na fórmula triunfante do luar.

Di-lo-ei ainda daqui a vinte mil milhões de anos se a tua boca não beijar.

 

+ 9. Esqueci-me de pensar ontem em D. Sebastião. Esqueci-me de lhe rezar no dia do seu aniversárlo.


+ 10. A necessidade de regressar ao ponto de partida implica deixar atrás de mim uma esteira de referências que me permitam a orientação.

De outro modo, estaria agora perdida.

Não estou perdida, estou cada vez mais enredada nos pontos cardeais.

 

+ 11. Importa a altura do Sol em relação ao ponto onde me encontro. Importa a estação da Lua e a fase da minha conversa. A noção de corte assume a sua relevância.

Reduzo a números a capacidade de errância. Ao contrário dos animais, o homem não foi dotado de sistemas naturais de orientação. Todo o seu trajecto se faz por indústria.

 

+ 12. Sou um ser que toma consciência da sua imperfeição. De resto, sou um pedaço de matéria tão complexamente organizada que ganha consciência. Matéria com consciência de si própria.

Somos Narciso remirando-se na água.


0. Adapto-me continuamente às novas condições que determinam a evolução da minha vida.

Faço uma viagem cósmica sem sentido. A vida não evolui para melhor nem pior, o ser vivo não caminha para. Caminha. 

Caminha ao sabor das cheias e no rasto da seca.

Mudo por uma simples questão de sobrevivência.

0. A lei que determina a estreita interdependência de sujeito, predicado e complementos é a lei da evolução.

Se, porém, fosse perfeita a adaptação de sujeito a objecto, eu não evoluía.

Sou consciência crítica porque a crise determina a minha contínua readaptação.

 

0. Só na arte persiste ainda a crença ingénua na perfeição. Na morte serena.

 

0. Reclamo para a galáxia uma serenidade absoluta?