i) O Universo exprime-se por via da música electrónica


 

174. O Diverso e o Verbo também.

Trocas e permutas, corrente alterna, sempre o mesmo crístico trístico a andar de biciclo. Bah! Que diferença entre alforria e aporia?

Alguém precisava de ocultar uma carta, pô-la à distância da polícia. Misturou-a com outras, bem em cima da mesa. Eram tudo cartas do mesmo baralho. Como descobrir a que mais faltava?

Ou imaginem apenas uma porta reflectida num salão de espelhos. Sou livre. Quem me proíbe de sair?

 

175. Sair para onde, sobre uma esfera de cristal? Facetada, como o globo ocular de alguns insectos?
Prende-me a inteira liberdade de partir.

 

176. De vez em quando perco as chaves de casa e não posso sair da noite. Fico na rua à espera, enquanto a Lua me ralha da janela.

 

177. Há duas espécies de tontinhos radicalmente oponíveis na sua diferença: eu, que escrevo isto durante a Santa Missa do Galo, e o pobre imbecil que desce a nave central de costas para a porta, e em passo de dança.

Baba-se todo, o esgraçadinho!

 

178. No meio de nós não está a virtude, está a indigência de espírito, a pachorrência social. A indiferença.

A páginas tantas beijocaram-me toda em sinal talvez de condolências. E depois vieram dois golems em fato de plástico, infantes triunfantes, junto de mim pedir esmola. Cinco paus foi quanto dei pelo espectáculo.

 

179. Lá mais para diante o sacerdote ergueu um rádio-telescópio branco em louvor de Mitra. O disco solar na forma da hóstia consagrada.

O Natal tem por trás o solstício de Inverno.

 

180. A cabeça inclina-se cada vez mais para a terra.

 

181. A abstracção resulta da exploração profunda das partes. Quando ver-te se rarefaz e um sismo toca a rebate.

 

182. Natas e comissários, campainhas e protérvios, aporias e cousas práticas... informáticas...

Adivinha, adivinha, no tutu tem uma linha? Era uma costura, uma continha...

 

183. É tam baixa a sua gravidade que tem o estômago cheio de gês negativos.


184. Há pouco quase me emancipei do corpo. Preciso agora de me emancipar do espírito.

 

185. Só que tenho muitos problemas na vida. Só que me chateiam de todos os lados. Só que nos meus dias há montes de trabalhos.

E nem eu séria capaz de sobreviver sem isso.

 

186. A emancipação!

Só consigo passar para o outro lado virando este do mais avesso possível. Sofro de claustrofobias angustiosamente... (No princípio estava «dominicanas», por tausa dos cães do Senhor. Mas como esse termo já foi ou será ainda usado, mudo para) franciscanas. Eu ando muito farta de andar a passo de tartaruga.

O problema é que o mais possível avesso tem sempre outro avesso mais avesso que lhe é superiormente avesso. Há um avesso superior a tudo!

E outro ainda mais travesso. 

 

187. Fiquei em casa na passagem de Ano porque estou muito ocupada com a criação.

Agora vou ver se a stelinha tem ovo.
                                             

188. Ontem o pensamento levantava-se numa fita bestialmente colorida. Quem conduzia a carroça dos pincéis, a manada das telas? Quem es tudava as simetrias e lia o solo, quem traduzia o terreno tricotado? Quem media as eras geológicas, que relógio se chamava Carbono-14? Quem pesava as parábolas antigas?

Quem repetia últimas sílabas?

Que nasal dança? Que momento ininterrupto desliza sob o meu flanco assustadoramente?

Que ser tão plástico e glabramente luminoso se deita a meu lado?

Sinto cada vez mais por eclipses.

 

189. Asas da noute, asas! Asas da noute! Que bailados suspeito entre as asas da noute, asas da noute?

Asas da visão.

Miragem.

Ou Phantom. Ou mesmo um atómico subma rino Caravelle.

Fiat.

Lux.

 

190. Nove em cada 10 estrelas usam lux própria.

 

191. A redundância reitera-lhe os meus mais vistosos cumprimentos.


192. Que os tendes bem pirosos.


193. Amanhã vou para a Régua de comboio. Numa directa e boa. Vou numa directa no foguete d'alba. Com a cuca boa!

 

ATENÇÃO SENHORES PASSAGEIROS: 

O COMBOlO QUE SE ENCONTRA ESTACIONADO NA LINHA 1 PARTE DENTRO DE MOMENTOS PARA AS ESTAÇÕES DA LINHA DO DOURO ATÉ BARCA D'ALVA!


  

194. Levantou-se a velida, lebantou-se alva. E vai passar as festas do Solstício com a família.

195. Perdi o adorno dos outros, os adamados. Reconheço-me pessoa de pouca gravidade. Gravemente reconheço que sois pessoas de grã siso.

Eu rio até ao mar num barquinho d'ouro.

 

196. Entre as asas da noute, asas da noute! Velo de prata. Carneirinho alcatifado. Pedrarias lentas, longe, nas pradarias da comoção.

Encaro a abóbada celeste em deslumbramento altíssimo. Quanto não terá custado tal ourivesaria?

Quem derramou sobre as suas tranças um prodígio assim de pirilampos?

Quem me projectou o filme na imaginação?

Asas da noute, asas! E este som que ouço! Este som que ouço, raccord impresso no banco memória? Como recordação do vácuo, corda nos liga ao absoluto?

Este som que ouço, nasalado e profundo rio de bronze? Liso e posto sobre a mesa de Natal, este som que ouço hora a hora, este pêndulo, este aparelho fonador, máquina bioquímica, computador arterial, essa creança... que tão má-creança tem...

Ah, este nosso coração!

 

197. O Universo emite vibrações electro-acústlcas.

E o Diverso também.

198. Não me despeço de mamãe e vou partIr.