b) As cousas significam por excomunhão de partes



 

19. Eu não gosto de escrever cousas soltas. Não tenho o hábito de colleccionadora.

Nem o de dominicana. Não tenho sequer o hábito de lavar a cara.

Vendo bem as cousas soltas, sou de uma extravagância absoluta.

Mas nas horas de procriação exacerbada podeis ver-me a colleccionar frases mesmo no meio da rua.

 

20. Tenho falhas de estar. Estar ao mesmo tempo aqui e muito longe. Onde não se distingue ser de star.

Ligo a telefonia. Vêm ecos diversos de diversos canais. Puzzles emitidos por um deus feito em fanicos.

O sono cansa, dói-me o corpo. A voz radiodifundida traz para junto de mim neve da Serra da Estrela.

Traz uma pedra de fogo. Traz a fome, a raiva, a felicidade planetária que se adia.

Adiamos tudo o que não conhecemos.

Traz Espanha, NATO, o Papa. O Oriente, o Médio, em FM.

Traz-me Rádio.

A minha tia morreu no Hospital de Oncologia.

 E traz o medo, o corso, o filipino. Esta voz tragicamente cósmica traz para dentro de mim a tua boca escarpada, e nela o desastre polaco.

 

21. Come biscoitos, pequena! Come biscoitos! Olha que há cousas melhores para vir do que dividires a vida em duas tablettes de chocolate!

 

22. Às vezes operamos entre as virtudes e os confeitos.

 

23. Se alguém me cravasse um punhal nas costas brutalmente enquanto escrevo voltada para ela?

Numa banda magnética captas facilmente o canto maquinal do Universo. Eu ando a aprender-lhe a língua.

Não leias os sentidos. Só o som deve chegar devagarinho à ponta dos dedos. Dedos tão sensíveis!

O corpo asa-se e reflui, reflui num cenário de roxo ideográfico.

Tua arte conceptual, teus minimalismos chocantes.

 

25. Reflui num canário ideográfico. Qualquer coisa me encandeia como um tição suástico. O coração arde. Meu coração arde e carboniza.

Fica literalmente esturricado.

 

26. É a noite. Baixo no horizonte perfeito. E é o som que te avizinha. Som imperfeito. Ressoa, ressoa muito alfim da madrugada.

Inclina-se agora para uma lua oriental aceite por diplomacia.

A Lua vaga.

 

27. Estar em partida permanente, nunca sentada nem aqui, estando aqui sempre sentada. Defronte de binómios e de bipolaridades abstractamente erguidos contra mim.

 

28. É um som que se avizinha: Hahahahaha!..., numa onda enfática. E o espaço já tragou a alvorada!

Hahahahahahahahah!............, digo eu. E o mar repete. O mar repete a última sílaba de um nome contínuuooo.

 

29. Realizei agora o filme em diferido de que me faltava o versículo 29.

 

30. Trago o tempo às costas. Assopra-me ao ouvido numa língua bárbara. Quem no entende?

Volto-me para ti que vens manselinho da sonora coluna. Usarei contigo, se preciso flôr, de rigor e de inclemência.

Ilumino-te a cara, e a noite abrasa-se. Dou um nome ao teu rosto reflectido nas ondas, e a noite abrasa-se. Isto é tudo o que posso. A pesar de não ser nada, a noite abrasa-se.

 

31. Abrasa-me!

 

32. Marquei-te encontro no bar de uma estrela, na mais amada estrela da galáxia. O meu amor sorri por ti abaixo num perfume siderado.

 

33. Se eu quiser, dou cabo disto tudo.

 

34. Graças a Deus que não escreves cousas inúteis...

 

35. Essa frase é inútil.

 

36. Aqui está outra frase inútil.

 

37. Outra outra outra

38. E outra e outra e outra ainda além da frase que nunca será a primeira nem a última frase útil ou inútil incomensuravelmente.