Procurar textos
 
 

 

 

 

 







NATURALISMO
& MAÇONARIA FLORESTAL (4)
MARIA ESTELA GUEDES
3. FERNANDO FRADE, 1946
 

O exemplo mais recente de que disponho de sinais de reconhecimento carbonário num texto científico data de 1946, e o naturalista em causa é Fernando Frade. Tal como a de Feijó, a bibliografia de Frade inclui motivos de perplexidade. É o caso de um problema, para o qual o ornitólogo Rafael Matias me chamou a atenção. Diz respeito à espécie Bugeranus carunculatus, grous que Frade cita para a Guiné-Bissau, mas que ainda ninguém conhece nessa região (Frade & Bacelar, 1957, p. 79-80). Apresentam-se em número de 3 na figura 3 da tríplice prancha em que o autor mostra os animais, a acompanhar informação terrorista, como é a menção a uma autoridade não referida em bibliografia, Araújo Ferreira e/ou J. A. Ferreira, desconhecida na literatura zoológica.

Este exemplo revela sinais maçónicos, no triplo uso do 3.’., mas não específicos da Maçonaria Florestal. No capítulo F) Funcionamento da missão em Africa, do Relatório da Missão Zoológica à Guiné Portuguesa, já temos significativas barracas. Este termo, designador de um dos tipos de agremiação carbonária (vendas, choças/cabanas e barracas) tem em português, além dos significados comuns ao Brasil, o de paródia.

Cito: “Quando se utilizavam as barracas, a sua instalação fazia-se de preferência à sombra de grande árvore”, “A cozinha funcionava geralmente em barracas improvisadas de querintim ou de folhas de palmeira”, “O alojamento dos indígenas fazia-se (...) em cabanas improvisadas, neste caso longe das barracas dos europeus”, “Uma lanterna junto de cada barraca e uma fogueira para afugentar animais bravios mantinham-se acesas durante a noite, sob a vigilância de um guarda” (Frade & Bacelar, 1946, p. 276).

Os BB.’. PP.’. certamente sorriram com as frases barraqueiras, pois Fernando Frade, ao descrever o canteiro, nem sequer se esqueceu de o situar à sombra de uma frondosa árvore.

Receio muito que a rematar a minha investigação sobre o Naturalismo, que dura há alguns anos, venha a descobrir a pólvora em vez da verdade. Voltando aos alunos de Domingos Vandelli que tiveram de se apresentar de sambenito na sala do Santo Ofício, em Coimbra, já vimos como é paradoxal uma das acusações que lhes foram feitas: a de serem naturalistas. O naturalismo é a religião natural, logo teria de ser condenado como heresia . Eis o que a propósito nos diz Gautrelet:

Não ha outra religião senão a religião natural.

Esta religião, única verdadeira, conservou-se nos templos gregos e egypcios de iniciação. Depois foi communicada a Jesus.

“Jesus transmittiu-a ao seu discipulo João, a quem conferiu a iniciação bem como a supremacia sobre a igreja que tinha estabelecido.

“Os mysterios da iniciação egypcia que tinham sido transmitidos a Jesus e d’este a João foram conservados no Oriente até que no anno 1118 foram communicados a Theobaldo, grão-mestre da Ordem do Templo.

“Os successores de Theobaldo conservaram-nos, e transmittiram-nos de mão a mão até à nossa época”.

Na prancha nº 100/04 em que o Sereníssimo Grão Mestre da Alta Venda Carbonária do Brasil, B.’. Pr.’. Walmir Battu, me convida para participar numa jardinagem da sua Floresta, vejo escrito:

“Assim, certo de vosso desvelo e deferência, reitero em nome desta Alta Venda, os compromissos com a investigação da verdade, pondo com o seu indeclinável auxílio, um ponto cabal na desordem histórica que cerca o Naturalismo Universal”.

O Naturalismo Universal a que se refere o Sereníssimo Grão Mestre, B.’. Pr.’. Giuseppe Garibaldi, é a Maçonaria Universal, significando isto que “maçon” e “naturalista” são palavras sinónimas, tal como as castigou Leão XIII na encíclica Humanum genus, apesar de um dos mais importantes investigadores das relações da Igreja com a Maçonaria, o dominicano Rousse-Lacordaire, discordar desta homologação.

BIBLIOGRAFIA
 

ALBUQUERQUE, A. Tenório d’ (s/d) - A Maçonaria e a Inconfidência Mineira. Gráfica Editora Aurora Limitada, Rio de Janeiro.

ALMEIDA, M. L. (1937) - Documentos da Reforma Pombalina. Coimbra.

CALMON, Pedro (s/d) - Historia da Bahia. Resumo Didactico. Comp. Melhoramentos de São Paulo.

CASTELLANI, José (2004) - O Apostolado. Em linha em:
www.triplov.com/carbonaria\bons_primos\apostolado.htm

CRUZ, Isabel (2001) – Silvestre Pinheiro Ferreira, o viajante sombra. Atalaia-Intermundos, revista do Centro Interdisciplinar de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade de Lisboa, 8/9. Em linha no TriploV: www.triplov.com/isabel_cuz/

FEIJÓ, J. S. (1783) - “Itinerario f[i]losofico que contem a rellaçaõ das ilhas de Cabo Verde disposto pelo methodo epistolar” / dirigidas ao Illº e Exmº Senhor Martinho de Mello e Castro pello Naturalista Regio das mesmas ilhas Joao da Sylva Feijó – 1783”. [26]f.,[51],7p., enc. : 2 mapas estatísticos color. ; 26 cm. - Ms. - Mapas estatísticos dos habitantes e produtos da ilha do Fogo . - Inclui uma lista de plantas. Secção de manuscritos da Biblioteca Nacional, Lisboa.

FRADE, F., Amélia Bacelar & Bernardo Gonçalves (1946) - Relatório da missão zoológica e contribuições para o conhecimento da fauna da Guiné Portuguesa. Anais da Junta de Investigações Coloniais, Lisboa, Vol. I. Trabalhos da Missão Zoológica da Guiné (1-5): 259-416. Em linha: http://triplov.com\hist_fil_ciencia\bissau\index.htm

FRADE, F. & Amélia Bacelar (1957) – Catalogo das Aves da Guiné Portuguesa. I – Non Passeres. Anais, Junta de Investigações do Ultramar, Lisboa, Vol. X, Tomo IV, Fasc. II, 1955. Trabalhos da Missão Zoológica da Guiné (XLIV): 1-194.

GAUTRELET, Padre Francisco Xavier (1873) – A Franc-Maçonaria e a Revolução. Traduzida do original Francez por Francisco d’Azeredo Teixeira d’Aguilar, Conde de Samodães. Livraria Internacional de Ernesto Chardron (Porto) e Eugenio Chardron (Braga).

GOMES, M. (1975) - A Maçonaria na História do Brasil. Gráfica Editora Aurora Limitada, Rio de Janeiro.

GUEDES, Maria Estela (1995) - João da Silva Feijó, viagem filosófica a Cabo Verde. Asclepio, Consejo Superior de Investigaciones Científicas, Madrid, XLIX (1).

GUEDES, Maria Estela (1999) - José Álvares Maciel. In Diana Soto Arango, Miguel Ángel Puig-Samper y Mª Dolores González.Ripoll (Editores): “Científicos Criollos e Illustración”. Ediciones Doce Calles, Madrid.

GUEDES, Maria Estela & ARRUDA, Luís (2000) - João da Silva Feijó, naturalista brasileiro em Cabo Verde. In: As Ilhas e o Brasil. Região Autónoma da Madeira, pp: 509-524. Online no TriploV.

GUEDES, Maria Estela (2002) - Martinho de Mello e Castro e as riquezas naturais. In: Discursos e Práticas Alquímicas II. Hugin Editores, Lisboa. Online no TriploV.

GUSDORF, Georges (1971) - "Les sciences humaines et la pensée occidentale". Vol. IV. Les principes de la pensée au siècle des Lumières. Payot, Paris.

MATTOS, Florisvaldo (1998) - A Comunicação Social na Revolução dos Alfaiates. Assembléia Legislativa do Estado da Bahia, Salvador.

OLIVEIRA MARQUES, A. H. de (1983) - A Maçonaria Portuguesa e o Estado Novo. Lisboa, Publicações Dom Quixote.

PESSOA, Fernando [1935] – As associações secretas. In: Fernando Pessoa, “Hyram - Filosofia religiosa e ciências ocultas. Notas e posfácio de Petrus. Tendências. C.E.P. s/l, s/d. Publicado originalmente no Diário de Lisboa, 4 de Fevereiro de 1935.

ROUSSE-LACORDAIRE, J. (1996) - Rome et les Francs-Maçons: histoire d'un conflit. Berg International Editeurs. Paris. 

ROUSSE-LACORDAIRE, J. (2002) – Les lumières maçonniques: entre naturalisme et illuminisme. In: José Manuel Anes, Maria Estela Guedes & Nuno Marques Peiriço (org.) - Discursos e Práticas Alquímicas. Volume II, Hugin Editores, Lisboa. Em linha em http://triplov.com/alquimias/jerome1.htm

VANDELLI, Alexandre A. (1927) - Colecção de cartas do Illustríssimo e Excelentíssimo Snr. Luiz António de Castro do Rio Furtado de Mendonça, Conde de Barbacena, e Snr. Abade Correa da Serra dirigidas a Domingos Vandelli, Comendador da Ordem de Cristo, Lente de Prima Jubilado na Faculdade de Filosofia da Universidade de Coimbra, Director do Real Museo e Jardim Botanico do Paço da Ajuda, etc. Que contêm algumas notícias sobre a fundação, e primeiros anos da Academia Real das Sciencias de Lisboa. Bolm Segunda Classe, Acad. Sci. Lisboa, 17: 414-459.

VARELA, Alex (2003) – José Bonifácio Andrada e Silva. Tese de mestrado, Universidade de Campinas. Em linha em: http://triplov.com/hist_fil/alex/