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VAMOS PARAR À CHOÇA!
Maria Estela Guedes
 

Recebi uma prancha (carta) de um Bom Primo, esmerada, suponho, na terminologia própria, que me levou a pensar que usamos muitos termos e expressões da gíria maçónica, alguns da Maçonaria Florestal Carbonária, sem termos a noção da sua origem. Isso também acontece noutros domínios da cultura oral, e não apenas no linguístico. Precisamos de aprender a ler esses sinais.

A história do Capuchinho Vermelho, a de Peter Pan, ambas de resto analisadas por Richard Khaitzine (1), a de Robin Hood, e até a série dos Astérix, são exemplos de uma literatura estreitamente unida à floresta, com as suas árvores frondosas, os seus lenhadores e lobos maus.

O cancioneiro popular também mostra traços da Maçonaria Florestal: “Ah, ah, ah, minha machadinha/, Quem te pôs a mão, sabendo que és minha?” Se reparar na imagem em cima, um emblema carbonário, vê a machadinha, cruzada com outro cutelo de forma a desenharem triângulos.

Outra canção para crianças, o “Jardim da Celeste”, transporta a jardinagem para o espaço simbólico que realmente tem no discurso carbonário. A prancha que recebi do Bom Primo Carbonário convida-me a "participar em nossa Floresta de uma Jard.'. relativa ao naturalismo". Claro que sim, terei muito prazer em jardinar na floresta, aliás um dos lemas dos Bons Primos é esse: É preciso transformar a floresta num jardim. Em suma, é preciso cultivar, aperfeiçoar, apurar, limar a casca grossa até ela ficar fina. "Casca grossa" e "casca fina", mais duas expressões dos Carvoeiros no discurso corrente.

“Ou vai ou racha!” – eis uma imprecação que parece ter saído do desespero de um dos carbonários que perseguiam João Franco, mas o ministro, à cautela, dormia cada noite em sua casa, e na hora H já não havia outra saída: “Ou vai ou racha!”. O rei morreu e a expressão ficou, a manifestar a ideia de que às vezes a única solução é a força.

Outra expressão carbonária, que na linguagem vulgar equivale a "resolver pela força", é “meter uma cunha”. O termo, na argótica florestal, significa "objectivo, finalidade": “Tem esta pranc.'. a cunha de fender um convite a V. Exª...” Tem o ofício o fim de convidar, e fica em suspenso o vocábulo “fender”, sinónimo de "rachar", que não conheço em funcionamento de calão comum. Rachar a cabeça a alguém é voto possível, fendê-la, muito improvável.

Não sei se a expressão, muito familiar em portugês, “Mas que grande barraca!”, faz algum sentido para os brasileiros. Não conheço nada que fixe na linguagem normal a expressão “Alta Venda”, porém “choça” e “barraca” são frequentes. Uma grande barraca é um grande desatino, uma vergonha por o trabalho ter saído mal. Direi de um texto mal escrito que ficou uma barraca, é uma barraca ter de comparecer a uma reunião importante às 8 horas e só aparecer uma hora depois. Nada de muito trágico, pelo contrário, há uma ponta de graça nas desgraças da barraca. Mais grave é a desgraça que nos leva direitinhos para a choça, porque essa é a pildra, o xadrez, enfim, a prisa... Em relação à Venda, o que temos em Portugal são topónimos que aludem a ela, como a Venda das Raparigas. Mas pode o topónimo não ter nenhuma relação com a Carbonária, ser uma referência a loja, o que naturalmente lembra a maçónica, mas “loja” designa, além dos objectos mais conhecidos, a parte térrea da casa de camponeses, em que se guardam alfaias agrícolas e as tulhas de cereais.

E andamos tantas vezes à trolha, no sentido real e figurado, não é verdade? A trolha é um instrumentos simbólico importante, com a machadinha, usada nos rituais carbonários para bater os toques, o compasso, o esquadro, o punhal e o canivete. Há várias pessoas do meio com esse nome ou pseudónimo, e jornais maçónicos denominados "A Trolha".

Olhando para a fotografia da Geochelone carbonaria (1), o que nos dizem as cores do animal? A tartaruga é de facto carbonária na cor, mas não de acordo com o carbonarius do dicionário de latim, sim de acordo com a simbólica da Maçonaria Florestal: ela é uma brasa! Depois de o fogo a ter consumido até à cinza, então, sim, poderia ser nigra ou obscura. Mas ela é vermelha e negra, e este é o jogo das chamas no carvão a arder, e o sentido de "formoso" que atribuímos a algum borracho a quem atiramos o piropo: “Você é uma brasa!”.

E depois a imaginação solta-se, porque há um “Vou recolher a vale de lençóis” que se ouve no mesmo registo do “Vale” situado em algum lugar do Nasc.'. do Templo de Jerusalém, onde é dada e traçada a prancha, aos 29 Sóis da sétima Lua, do ano da graça do N.'. D.'. B.'. Pr.'. Jesus Cristo, de 2004 – E.'. C.'.

Partamos do princípio: porque o Nosso Deus Bom Primo é Jesus Cristo, aquele “E.'. C.'.” tanto pode ser Era Cristã como Era Carbonária, o calendário deve ser o mesmo. Se não for, logo que possível se corrigirá.

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(1) Directório de Richard Khaitzine
(2) A tartaruga carbonária