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FRANCISCO SOARES

“Tirar Doutrina”: Cruzamentos Narrativos de Cadornega

INDEX

Contextos
(In)definições
A língua: Intenção estética, oralidade e originalidade
Intenção estética
Oralidade
Estórias cruzadas
Recursos de conexão
BIBLIOGRAFIA

A língua: intenção estética, oralidade e originalidade

A língua portuguesa que se recria nesses meios urbanos, tradicionais e coloniais, em intensa interacção e com muita mobilidade social e geográfica, é nesse sentido crioula, transformada e apropriada pelos locais ou com os locais. Servindo as conveniências do negócio e das estratégias político-militares correspondentes, num meio multilinguístico e multicultural, ela é ao mesmo tempo diplomática e tensa, incisiva e subtil, misturada e precisa. É praticada por pessoas atentas, perspicazes, que usam as frases e os termos apropriados às personagens e às situações, porque da instantânea sensibilidade ao outro dependem negócios, poderes, liberdade e vida. No transcurso biográfico dessas personagens passam também negociações culturais que vão abrir os olhos à percepção do outro, mesmo que ela seja só oportunista. O oportunista é, em geral, perspicaz. E a sua perspicácia permite-lhe compreender o mal-estar dos outros, mesmo que não possa reconhecê-lo abertamente. Por uma percepção social igualmente contraditória e eficaz é que, apesar de oscilar entre integração e separação, Cadornega aponta a causa do mal-estar dos outros: “Os mais deles [gentios] pouco devotos e amigos da nossa Nação Portuguesa, que basta ser muitos deles escravos e outros conquistados pelas armas para lhes causar ódio e malquerença” (1972, III: 381-382).