Procurar textos
 
 

 

 

 

 






JOSÉ CASQUILHO
O MISTÉRIO DO PORTUGUÊS

Na iconografia real portuguesa nunca mais encontrámos o Português depois da referida pintura datada de 1750, talvez com uma excepção que referimos à frente. Dir-se-ia que desapareceu pouco depois. O que lhe terá acontecido?


Podem-se fazer conjecturas. A primeira é que, com o terramoto de 1 de Novembro de 1755, teria sido necessário fazer face a um grande empréstimo (internacional) para a mobilização de recursos para a reconstrução da cidade de Lisboa.

 


(Lisboa antes e durante o terramoto de 1755)

O Português teria sido dado como garantia do empréstimo, subordinado a um contrato com certo horizonte temporal. Não conheço nenhuma referência a tal empréstimo, mas fica a hipótese levantada.

A segunda hipótese é mais promissora. Sabe-se que em 1801 na ressaca da Guerra das Laranjas - a derrota mais estrondosa do exército português de que se pode falar - perdeu-se Olivença para a Espanha de Carlos IV, sob o comando do Generalíssimo Godoy, favorito de Maria Luísa de Parma, rainha de Espanha.

A Guerra das Laranjas, que durou duas semanas, ganhou esse nome porque Manuel Godoy arrancou dois ramos de laranjeira, frente a Elvas, que enviou à raínha Maria Luísa, como sinal de vitória. Seguidamente ao Tratado de Badajoz, assinado com a Espanha, também se assinou o Tratado de Madrid com a França, onde, contra a promessa de paz no futuro por parte de França e a título de indemnização pala campanha do Rossilhão, entre outras coisas Portugal obrigava-se a pagar vinte milhões de libras, parte em dinheiro, parte em diamantes e parte em valores comerciais. O tratado de Madrid foi assinado em 29 de Setembro e ratificado por Portugal em 28 de Outubro de 1801.

José Rosas Júnior refere que por volta de 1801 foi contraído um grande empréstimo pela coroa portuguesa de 12 milhões de florins, onde foram dados como garantia diamantes, junto das firmas Hope da Holanda e Bahring de Londres. E assim, face às enormes importâncias contratadas pela coroa portuguesa neste período, imagina-se que o Português poderá ter ficado retido nos cofres de algum banco, provavelmente inglês - à conta da velha aliança - até que, expirado o prazo, voltou a ver a luz do dia, na posse de novos donos. Será este o mistério do Português?




Nesta hipótese as únicas pistas que conheço é a fuga da família real em 1910 e a da venda de parte das jóias da coroa pelo Banco de Portugal, em 1912, a seguir à implantação da Républica.

Mas, regressando aos factos, não deixa de ser interessante encontrar o Português como o símbolo do Despotismo Iluminado da monarquia mais rica do seu tempo, o Barroco da primeira metade do século XVIII - afinal o Português era maior que o Estanque de Espanha, o Regente de França e mesmo que o posterior Koh-i-Noor de Inglaterra (no seu último talhe). E depois, quase dois séculos mais tarde, encontramo-lo como símbolo do Glamour do American Dream, até que umas décadas depois se torna um dos elementos importantes das colecções do novo império, onde ainda hoje permanece.