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VICTOR RUI DORES
Sismo na madrugada

Humberto Moura
S
ismo na Madrugada
2003, horta, edição do autor

Com provas dadas no conto e na novela, através dos livros Na Diáspora do Tempo (edição da Câmara Municipal da Horta, 1996) e Errância de Pedra e de Sal (edição de autor, Horta, 1998), Humberto Moura aventura-se agora no romance: Sismo na Madrugada (edição de autor, 2003), que flui ao longo de 361 páginas em vozes e escritas de grande fôlego narrativo.

Romance de um tempo e de um espaço (a acção parte da ilha para o mundo e decorre a partir dos anos 30 até à ocorrência do sismo de 9 de Julho de 1998), Sismo na Madrugada dá conta da história de um homem, Quevedo, que, aos 17 anos de idade, deixa a ilha do Faial e parte para a grande viagem da vida. Há nele um desejo de viagem, uma ânsia de largar amarras e de ultrapassar horizontes. E com ele se vai cruzar uma vasta galeria de personagens (36 ao todo), gente de grande dimensão humana e fundura psicológica.

A narrativa articula-se como uma viagem permanente. Uma viagem de muitas partidas e de poucos regressos. Através dessa viagem, o narrador encontrou um pretexto (ou um pré-texto) para ficcionar a partir de acontecimentos reais e incontornáveis da História europeia e mundial do século XX. E é através do olhar de Quevedo, jornalista de profissão, que nos são dadas descrições sobre a Guerra Civil de Espanha e a Segunda Guerra Mundial; é ele que, enquanto repórter de guerra, dá vivo testemunho de horrores, perplexidades, inquietações, vicissitudes e dramas desses conflitos armados.

Contrariamente ao que o título pode dar a entender, Sismo na Madrugada não é a história de um sismo. É, sim, um romance de encontros e reencontros, partidas e chegadas, sonhos e pesadelos, afectos e perdições, lonjura e saudade, distância e ausência, vida e morte, no registo mais sentido de uma escrita pessoalíssima e profundamente humana. E é também uma sincera e sentida declaração de amor e de esperança às ilhas, ao mundo, à natureza, aos animais e às pessoas. Porque este é, essencialmente, um livro sobre a condição humana: o destino e a errância de um homem (a sua peregrinação interior) que transporta uma ilha e uma mundividência.

A obra é também lugar de confronto, de denúncia de verdades ilusórias e de renúncia às máscaras de um quotidiano alienante. Porque há este dado inapelável: Portugal chegou tarde à História... E quase todas as personagens deste romance sofrem as conse­quências disso mesmo. Daí os olhares (críticos e vagamente satíricos) que o narrador lança sobre um tempo português fascizante e sobre as mitologias do nosso passado recente.

Com uma eficaz e eficiente fluência narrativa, Sismo na Madrugada está bem escrito e bem carpinteirado. E lê-se com emoção e comoção.

Victor Rui Dores

 

Victor Rui Dores - Conservatório Regional da Horta. Rua Marcelino Lima. 9900-122 Horta.