Direcção de Miguel de Carvalho

EXPOSIÇÃO INTERNACIONAL DE SURREALISMO ACTUAL
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Documenta

Surrealismo em Coimbra
Um conjunto de 320 obras para fazer a circum-navegação ao actual panorama do Surrealismo. É a grande exposição internacional que a Galeria Pinho Diniz e a Casa Municipal da Coimbra promovem até ao próximo dia 28 de Junho, trazendo àquela cidade cerca de 130 artistas de todo o mundo. Uma mostra comissariada por Miguel de Carvalho, um livreiro e antiquário, ele próprio artista e devoto das potencialidades do inconsciente, tal como as advogava André Breton, naquele que foi um dos mais importantes manifestos artísticos do século XX.

Esses universos fantásticos e maravilhosos, recriados em pinturas e esculturas, em colagens ou poemas, em fotografias e esculturas, rumam agora a Coimbra, na tradição das exposições colectivas do Surrealismo. Jan Giliam, António Beneyto, Beatriz Hausner, Guy Ducornet, Amirah Gazel, Miguel Lohlé, Denis Magerman, Andreoni Gaetano, Fátima Roque, Rik Lina, Gerrit Komriji, Charles Hofmann, Louis Lehmann, Daniel Hanequand e Dave Boborske são alguns dos nomes estrangeiros representados, a par de alguns artistas portugueses. A mostra inclui ainda muita documentação e uma sala com sessões contínuas de cinema, com documentários e filmes, nomeadamente de Luís Buñel e Aube Elleouet, filha de Breton.

Uma iniciativa única no nosso país, sem “quaisquer proveitos comerciais”, como explica o comissário. “Convidámos os artistas e as participações foram espontâneas. A exposição tem apenas por objectivo apresentar ao público português os reflexos mais e mais representativos da actividade surrealista actual”, acrescenta Miguel de Carvalho. Tudo isto com um orçamento reduzido e a colaboração de todos os artistas. Surrealismo revisitado, em Coimbra.

Jornal de Letras: Sabemo-lo um livreiro antiquário e editor apaixonado pela Cultura Portuguesa, nomeadamente a literatura dos séculos XIX e XX e pelo movimento surrealista, mas como foi possível organizar uma exposição de tamanha dimensão em Coimbra?

Miguel de Carvalho: Coimbra esteve sempre arredada dos palcos das principais movimentações dos surrealistas portugueses, cujas acções se centralizavam sobretudo em Lisboa. Inclusive, Mário Cesariny chegou a realizar uma exposição na capital em 1984, de menores dimensões, mas mesmo assim foi a última. Contudo, tínhamos Coimbra que contribuiu com um dos mais importantes movimentos da modernidade portuguesa pela forma como abraçou a revista Presença, criada em 1927. Em Outubro passado pensei que os pintores, poetas, escritores, escultores, fotógrafos entre outros artistas surrealistas, mereciam uma homenagem na cidade. Contactei a Câmara Municipal, pelo Natal convidei os artistas e adesão foi surpreendente. Os participaram enviaram as obras porta e risco e os que vieram deslocaram-se por conta própria.

Jornal de Letras: Em que pensava quando decidiu avançar, com poucos meios e muitas incertezas, tendo em conta que, tal como referiu, Coimbra andou “arredada” do movimento Surrealista?

Miguel de Carvalho: Em abrir a mente das pessoas, provocar a mentalidade no sentido de eliminar tabus, preconceitos e ordens estabelecidas. O público conhece sobretudo as obras dos poetas e dos artistas surrealistas mais célebres – Salvador Dali, Joan Miro ou René Magritte -. Em contrapartida, a complexidade desta aventura, nos seus aspectos políticos, revolucionários e éticos, a sua oposição a todas as formas de opressão e obscurantismo, assim como a sua defesa apaixonante dos valores da liberdade, são na maioria dos casos os menos conhecidos.

Em Portugal o Surrealismo é considerado tardio tendo em conta as datas do seu aparecimento. É essencialmente pelas mãos de Cruzeiro Seixas e de Mário Cesariny que ele tem sido conduzido até aos nossos dias e alimentado constantemente com diversas acções, tanto artísticas como editoriais através de livros e manifestos. Contudo, até há poucos anos, o surrealismo em Portugal tem sido na maioria das vezes injustamente marginalizado pelos historiadores e críticos de arte, tanto portugueses como internacionais. Pensei apenas em fazer alguma coisa para inverter essa tendência.

Jornal de Letras: É apenas um amante e estudioso do Surrealismo, ou vai mais além?

Miguel de Carvalho: O Surrealismo é a minha grande paixão cultural. Iniciei-me, em 1995, como colagista e no desenho.

Jornal de Letras: Como é que se descobre que se é um artista surrealista?

Miguel de Carvalho: O Manifesto Frida Kahlo & Eugénio Granell, publicado em 2006, constitui uma resposta a essa atitude quando refere que “ser surrealistas não se decide ser, não se come, nem se pinta; sente-se. O surrealismo é sentido sempre mas sempre por quem ama, quem sonha e por quem quer ser livre, não importando a forma como se expressa”.

 

Jornal de Letras, 18 Junho – 1 de Julho de 2008

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