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II BIENAL DE POESIA
SILVES. 2005
TERESA TUDELA
O QUE É A POESIA?
 

Escrevo para me entender.

Que poderia eu ter a dizer que não tivesse sido dito? Já. Um milhão, um trilião de vezes?

Que poderia eu ter a dizer que não fosse rigorosamente o mesmo que todos os outros pensam, ou melhor, sentem - e dizem? Ou não dizem, por palavras ditas, mas por ruído atroz, silêncios feitos? Das melhores ou piores maneiras.

Poderei apenas fazê-lo de outra maneira, ainda.

A minha maneira.

Usando a visão que me é dada no regresso do distanciamento que criei.

Escutando no silêncio mais absoluto a ausência de ruído.

Perseguindo a limpidez da ideia.

Não é a escrita mais do que o registo desse percurso rizomático com um esquelético Minotauro, exangue, ao centro.

No melhor dos casos, dela nascem veludíssimas pérolas, límpidos cristais - a quem é dado chegar ao polimento perfeito do nácar, à pureza essencial da rocha, é dado o ofício de inscrever sinais no tempo.

São raros - raríssimos.

De voz inconfundível no rilhar dos séculos.

Tudo o resto é oficina.

Preparação do terreno.

Trabalho.

Duro.

Meticulosamente aplicado aos mais recônditos refegos do ser.

E ser.

O que é difícil.

Difícil sempre.

Hoje, neste desfigurar acelerado do tempo, cada vez mais extenuante e difícil.

Inconfessadamente difícil.

Por isso escrevo.

Para me entender.

Me aligeirar de bagagem escusa.

E se puder levar alguém de boleia de caminho - não me pesa, pelo contrário, fazem-me bem uns passos de companhia. Chega e vai. Chego e continuo.

Apenas isso o poema - brevíssimo degrau de encontro - três passos de companhia.

Não sei para onde vou. Se o soubesse, não escrevia.

Sei que hei-de ir por onde me leva o poema.

E se a tanto me ajudar engenho e arte, compreenderei depois, o que ao dizer me queria.

E se dele há ecos, reverberações de espelho a outros, isso quererá ele dizer e a mim me escapa - depois da sua passagem, não há autor, nem escrita - só um corpo de memória e um escrivão à escuta.

 

Teresa Tudela, Abril/2005

 

SILVES, CAPITAL DA PALAVRA ARDENTE